Como fica o ensino híbrido no pós-pandemia
Últimos dois anos trouxeram oportunidades educacionais não experimentadas anteriormente, e mostraram que a tecnologia deve fazer parte do dia a dia das instituições
Enquanto já fazia parte do dia a dia de instituições de ensino superior (IES), o ensino híbrido estava longe da realidade das escolas. Mas a pandemia, mais uma vez, oportunizou (por necessidade) uma adaptação. Especialmente em 2021, com a reabertura gradativa do comércio, de centros educacionais e do lazer, este formato de ensino teve de ser adotado por diversas instituições que não o exploravam até aquele momento. Mas a educação híbrida ficará no pós-pandemia?
Para o sócio-fundador da Educa Insights, Daniel Infante, deveria. Isso porque há uma demanda dos jovens por conveniência: eles não querem passar todo o período letivo dentro de uma escola ou universidade, buscam por flexibilidade e disponibilidade no ensino.
“Em estudos recentes que fizemos, em média os estudantes já têm um aceite de aproximadamente metade da carga horária fora do campus”, destaca.
Nesse sentido, ele enxerga o ensino híbrido como a concepção mais adequada para o futuro – e para o presente, caso seja possível. Principalmente por conta da realidade sociodemográfica brasileira.
Professora do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Rute Maria Fávero concorda com essas posições. Ela acredita que, para que a educação seja mais acessível, também deve ter momentos remotos, especialmente em um país tão extenso quanto o Brasil.
Historicamente, a educação é uma composição híbrida de mediadores humanos e não-humanos, de acordo com a professora do Departamento de Administração Escolar da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Elena Maria Mallmann.
“A realidade híbrida envolve investimento em políticas de fomento e indução para criar contextos e condições de trabalho criativo, crítico e inovador tanto para os professores quanto para os estudantes”, afirma.
O espaço utilizado pela tecnologia em sala de aula pré-pandemia era inferior, em comparação à pandemia. Ou seja, a situação acelerou um processo que já iria ocorrer.
Para os estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental e para os do Médio, a hibridização pode ser mais fácil, mas os pequenos também necessitam desse acesso, por mais complexo que seja inicialmente, explica Rute.
“É muito importante que o aluno também tenha uma alfabetização digital”, diz.
A grande questão é que as instituições precisam adequar o formato híbrido à própria realidade. Isto é, pensar em como estruturar a matriz pedagógica e a estrutura física da escola ou universidade, a partir das próprias demandas e dos alunos. Daniel Infante explica que é necessário oferecer um serviço possível, em que a mensalidade (pensando em instituições privadas) seja condizente com a qualidade do ensino.
“O primeiro grande passo é ter uma lógica de composição de modelo de curso que seja inovadora e que permeia tudo que uma hibridização exige. Não é uma categoria fácil de colocar na prateleira e vender como o presencial e o EaD”, destaca Infante.
Além de compreender, enquanto gestor, as exigências pedagógicas do formato e adequar o ambiente escolar a ele, é necessário que os corpos docente e discente entendam a necessidade do ensino híbrido e sejam capacitados para trabalhar com o modelo.
Inicialmente, os docentes devem aprender para poder ensinar esse formato aos alunos. Este é um dos desafios mais prementes, conforme Elena Maria Mallmann.
“A fluência tecnológico-pedagógica de professores e gestores implica inovação e mudança cultural”, explica.
Com o início da pandemia, um dos maiores problemas foi esse: os docentes não tinham conhecimento técnico e pedagógico para ministrar aulas remotas. Esse aprendizado não ocorre da noite para o dia, é um processo investigativo e de autonomia. Por isso, esse formato exige mais de toda a comunidade acadêmica.
De qualquer forma, com o entendimento dos gestores e professores, a compreensão por parte dos alunos torna-se menos complexa. O diálogo, a troca, a participação e a colaboração fazem com que o aluno se sinta à vontade.
A implementação pode trazer benefícios como redução de custos para as instituições, um ensino mais atual e atraente por ser tecnológico e até a diminuição da evasão escolar.
Depende do contexto em que cada instituição está inserida, justamente porque o modelo exige maior envolvimento da comunidade escolar/universitária. Para uma escola pública, por exemplo, pode ser mais complicado, levando em conta que os investimentos em educação no Brasil são limitados e o custo de infraestrutura para o ensino híbrido (um dos pontos principais) pode ser alto.
Além disso, a hibridização vai muito além de ter aulas remotas e presenciais, é todo um entendimento de que a tecnologia pode fazer parte do ensino como um todo. Utilizar diferentes ferramentas, didáticas, formar parcerias com outras instituições ou empresas, inclusive, de outros países, são apenas algumas das oportunidades que esse formato proporciona.
“A mescla e acoplamento entre momentos on-line com interatividade hipermidiática e produção escolar off-line, atividades individuais e coletivas com revisão entre pares, entre outros exemplos, favorecem a pesquisa, o diálogo, a capacidade de análise crítica, a criação, compartilhamento de ideias e solução de problemas”, declara a professora Elena.
Em uma instituição particular o maior desafio talvez seja compreender e acreditar no modelo, segundo a professora Rute. Ela comenta que parte dos alunos também pode achar que, estudando de forma híbrida, não estará qualificado.
Rute foi a primeira professora a ministrar uma disciplina a distância em uma unidade da UFRGS, e conta que todos os estudantes foram aprovados, mesmo ela sendo bastante exigente.
“Eles me disseram: eu aprendi a estudar, no início foi difícil, mas depois consegui. Então os alunos precisam se esforçar e entender como devem estudar, porque o estudante que não quer não estuda remotamente, tampouco presencialmente”.
Ou seja, a implementação envolve compreensão do modelo e da realidade da instituição, a intenção de adotá-lo, a capacitação do diretor, de professores e de alunos e investimento.
Conforme o diretor adjunto de unidades escolares do Poliedro Sistema de Ensino (SP), Luis Gustavo Megiolaro, o currículo básico da instituição será híbrido daqui para frente. Ele concorda que o aprendizado trazido pela pandemia mostrou que é possível transmitir aulas, mas não acredita em um ensino 100% híbrido na educação básica.
Antes da pandemia, o Poliedro já tinha atendimento, orientação, plantão, atividades de apoio ao aluno – redação e reforço, por exemplo, presenciais e remotas. Permanecem fazendo parte do currículo dos colégios.
Os itinerários formativos também poderão ser abordados de forma híbrida pelos pólos do Poliedro ou instituições parceiras. Assim como exercícios, oficinas, aulas específicas, cursos etc poderão seguir esse modelo de ensino. Somente a base de conteúdos do currículo não terá essa dinamicidade, ou seja, será 100% presencial.
O Poliedro adotou o ensino híbrido no segundo semestre de 2020, e seguiu com o modelo até o final de 2021. Foram idas e vindas, conforme a situação da Covid-19.
“Foi um aprendizado contínuo, gradativo, que reforçou a importância da escola presencial. Mas também mostrou que a tecnologia pode ajudar o professor em muitos processos de aprendizagem na vida do aluno. A tecnologia bem discutida, usada e inserida como ferramenta pedagógica pode ajudar a escola a melhorar”, declara o diretor adjunto.
De volta ao modelo totalmente presencial, Luis entende a importância da personalização por meio da tecnologia, desde que faça parte da escola presencial – ambiente muito representativo, especialmente de socialização entre os estudantes.
“A pandemia foi uma oportunidade muito grande de modernização das escolas. Antes se falava que o mundo se modernizava e as escolas não”, comenta.
Entre desafios, conflitos e compreensões, uma certeza é de que a tecnologia permanecerá presente na educação. Por um lado, as escolas ou universidades podem não adotar o modelo híbrido no currículo básico, mas possivelmente farão atividades – mesmo que complementares – utilizando o formato. Se isso for considerado uma instituição com ensino híbrido ou não, depende de como a composição é abordada e quanto espaço ocupa na grade curricular.
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