Como a reforma tributária pode impactar nas escolas?

Especialistas explicam o contexto das articulações frente aos parlamentares, falam sobre perspectivas e o que pode favorecer o ensino privado no país

por: Eduardo Wolff | eduardo@padrinhoconteudo.com
imagem: Freepik

Nos últimos anos, o setor de educação obteve vitórias expressivas em decisões em relação à reforma tributária, em especial, na PEC 45/2019. Por meio do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Privado, existe uma articulação em prol do segmento, com o intuito de preservar os milhares de estudantes do impacto das mudanças que possam provocar aumento das mensalidades. 

Segundo a Federação Nacional das Escolas Particulares (FENEP), o texto aprovado na Câmara dos Deputados, em julho, foi bastante positivo no direcionamento de uma alíquota neutra para as instituições particulares de ensino. No momento, o setor trabalha para a preservação do que foi conquistado por meio do diálogo com os senadores. 

Para mensurar os impactos da reforma tributária nas escolas, a FENEP promoveu um webinar no dia 17 de outubro. O evento online contou com a mediação do presidente da FENEP, Antônio Eugênio Cunha, e as participações da presidente da Câmara de Educação Básica no Conselho Nacional de Educação (CNE), Amábile Pacios, e do consultor e diretor de Relações Institucionais da CBPI Produtividade Institucional, Emerson Casali.

Na live, o presidente da Federação mencionou que foram construídos dados fundamentados em pesquisas sobre o segmento da educação (que serviram de embasamento para as articulações na Câmara e no Senado) e que estão disponíveis para todo o gestor de escola particular e sindicatos. “Vale a pena também lembrar que nos momentos de dificuldades, vários presidentes dos sindicatos entraram em ação e nos ajudaram bastante com as relações com os nossos parlamentares”, ressaltou.

Casali reforçou que para uma boa narrativa e convencimento com credibilidade perante aos técnicos do governo foi preciso demonstrar bons números e boa análise. “Conseguimos juntar os dois”, disse.

Já Amábile lembrou que, em 2004, com a MP 232, foi iniciado esse movimento da educação envolvendo a reforma tributária. Além da MP 234, que propunha criar uma nova alíquota de PIS e COFINS, que poderia prejudicar todos os setores de serviços. “Na ocasião, ficamos muito próximos desse setor, que não era organizado. Por isso, profissionalizamos os dados e começamos a mostrar o que é justo para ficarmos no mesmo patamar e desonerar o nosso segmento (educação)”, frisou.

O atual foco da reforma

Conforme comentou o consultor, a reforma tributária tem foco em impostos relacionados ao consumo. São eles: Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), ICMS e Imposto Sobre Serviços (ISS). 

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Ele também salienta que houve mudanças no Imposto Sobre Propriedade de Veículo Automotor (IPVA), no Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e no Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). “98% dessa reforma impactou a questão do consumo. São impostos que incidem diretamente sobre a mensalidade estudantil”, referiu. 

A previsão é aprovar a lei complementar em 2024. “Os impactos devem ocorrer a partir de 2027, principalmente na mensalidade”, comentou.

Quanto à reforma no imposto de renda, a discussão de tributar os dividendos, que, hoje, são isentos, deve ocorrer em 2024 ou em 2025, bem como a proposta de desoneração da folha de pagamento. “Esses são desafios futuros que teremos nos próximos anos e que vão impactar em nossos esforços”, sinaliza. 

Casali ressaltou que havia uma narrativa de que o setor de serviços pagava poucos tributos e quem consumia eram apenas pessoas com maior poder aquisitivo. “Mais de 80% dos alunos da educação particular são das classes C, D e E no Brasil. Então, qualquer aumento de preço, a gente sabe que tem uma sensibilidade, significa uma perda de alunos”, salientou. 

Em um olhar para o mundo, foi observado que de 102 países, 65 isentam a educação e 20 cobram entre 0% e 10%. “No Brasil, a carga equivalente seria entre zero e dez. Com a proposta de pagar mais de 10%, ficaríamos entre os 17 piores países. Entendemos que precisa ser estimulado, cada família investir na educação do próprio filho, todo mundo ganha”, reforçou.

O que foi proposto 

A ideia básica inicial do Governo Federal era transformar as tributações que incidem diretamente sobre bens e serviços em um imposto único, ou seja, unificar ICMS, ISS, PIS, COFINS e IPI. “A ideia era simplificar e todo mundo pagar da mesma maneira”, disse o consultor. 

No entanto, depois de muita discussão e avanços, foram indicados dois tipos de impostos: um que substitui o ICMS e o ISS e outro o PIS e o COFINS. “O IPI ainda tem algumas questões específicas. Vão criar um imposto seletivo sobre quem causa danos à saúde e ao meio ambiente”, pontuou.

Educação, saúde, transporte urbano e outros setores terão uma isenção completa. Alguns exemplos são da indústria farmacêutica, que terá casos para medicamentos para câncer, e o imobiliário, que terá um regime todo próprio. “Nós (da educação) conseguimos ficar no que era o nosso objetivo”, salientou. 

O que vai mudar?

Atualmente, a educação está dentro de um regime cumulativo, ou seja, paga uma guia de ISS e duas de PIS e COFINS. Esses são os impostos diretos que uma escola costuma pagar. Em média, são pagos R$ 3,5 mil de PIS e COFINS, e R$ 2,5 mil de ISS (dependendo do município). 

Por mais que as escolas possuam impostos diretos, existem outros impostos embutidos. “Se consome energia, tem PIS, COFINS e ICMS. Se pagar por segurança tem PIS, COFINS e ISS. Existem tributos escondidos que são pagos toda vez que se compra algo de um fornecedor. Isso se chama resíduo tributário e essa é a carga indireta”, salientou.

Por esses motivos haverá a migração do setor para o regime não cumulativo, que funciona a partir das despesas. Segundo o consultor, a alíquota será mais alta, mas todos os impostos escondidos serão o resíduo tributário. Se uma escola tiver que pagar determinada quantia, tudo será destacado (energia, segurança, pacote pedagógico, informática, entre outros itens). “Vou abater isso e será chamado de crédito tributário. Se alguém me perguntar: qual será o impacto? Digo que será diferente em cada escola. Cada uma consome de um jeito diferente”, ponderou.

Criação do ProBásico

Casali mencionou que o setor da educação possui uma defesa muito forte quanto ao ProUni, pois tem benefícios por meio de bolsas para pessoas de baixa renda. A título de comparação, com dados entre 2015 e 2017 (Enade/INEP/MEC), um aluno prounista custava R$ 4,6 mil por ano. Já um estudante de uma universidade pública tinha um custo, ao ano, de R$ 28,6 mil. “É 16% do custo estudando ProUni e os desempenhos dos alunos é o mesmo na avaliação do MEC”, frisou.

Uma “bandeira” da FENEP,  tanto na Câmara e no Senado, ainda com resistência, é a criação de um programa igual ao ProUni, mas para as escolas do Ensino Básico. Nessa proposta, permite isenção do IRPJ, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLVL) e da CBS. 

Para incentivar o ProBásico, alguns números foram apresentados pelo Fórum. “Poderíamos ter mais 150 mil crianças com bolsas, estudando nas melhores escolas do Brasil. Isso significa uma isenção de R$ 478 milhões e um custo final para o Estado de R$ 3,4 mil por aluno. Um custo bem baixo para colocar um estudante em uma escola particular de qualidade”, analisou o consultor.

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