Como estão as escolas afetadas pela enchente após três meses

Mesmo com soluções encontradas, as instituições de ensino ainda necessitam de apoio para as reconstruções de suas estruturas

por: Eduardo Wolff | eduardo@padrinhoconteudo.com
imagem: Colégio Madre Bárbara, Divulgação

Passados mais de três meses da maior enchente que atingiu o Rio Grande do Sul, muitas escolas tiveram que realizar uma força-tarefa para recuperar os estragos causados. Em vários casos, os prejuízos ainda são incalculáveis, no entanto, o apoio da comunidade escolar e de voluntários se destacou diante de um cenário devastador. 

Com o intuito de demonstrar um panorama de como estão algumas das instituições de ensino, a reportagem do Educação em Pauta entrevistou quatro diretores de escolas, tanto do Vale do Taquari como da Região Metropolitana – regiões bastante afetadas pelas mudanças climáticas -, que relataram quais foram as estratégias de reconstrução.

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Planejamento estratégico em ação

Em Roca Sales, a diretora do Colégio Scalabriniano São José (ESI São José), Rosane Volken, destaca que os principais danos na instituição de ensino foram na parte elétrica, na pintura, na internet e no sistema de segurança. Portas, pisos e algumas paredes das salas de aula também foram muito afetadas. 

Com o retorno das aulas no dia 20 de maio, Rosane comenta que algumas famílias chegaram a mudar de cidade e, com isso, houve a transferência de alunos. “Muitas pessoas da nossa comunidade foram atingidas e ainda estão se reorganizando”, ressalta.

Ela comenta que houve um grande acúmulo de lama no pátio e na área verde do colégio. Mesmo com a ajuda dos professores, pais, estudantes, funcionários e voluntários, a limpeza desta área ainda não foi concluída.

Algumas obras já foram executadas e as demais estão acontecendo de acordo com a programação da direção. “Dependemos da disponibilidade de profissionais, condições climáticas e de recursos”, relata.

As salas de aulas já receberam a troca do piso | Crédito: Colégio Scalabriniano São José

Conforme afirma a diretora, é difícil elencar tudo que ainda falta fazer, pois, ao ir reformando, novas necessidades acabam surgindo. “Bastante coisa ainda precisa ser feita. Estimar prejuízo é muito difícil, se botar na ponta do lápis, dá cerca de R$ 500 mil”, conta.

Todas essas ações foram incluídas em um planejamento estratégico da Escola São José, visando minimizar estes danos. “Trata-se de um grande desafio, pois a região do Vale do Taquari sofreu um grande impacto e a educação privada é fundamental nesse processo de reconstrução”, pontua.

Criação da comissão de enchente

Ao ser questionada quais foram os principais danos na instituição, a diretora do Colégio Madre Bárbara, de Lajeado, Maria Helena Jacques, é taxativa: “muitos”. Ela descreve que todo o sistema de Tecnologia da Informação (TI), as catracas, os motores das bombas d’água, os portões, as divisórias das paredes das salas, a capela e o piso do ginásio poliesportivo, entre outras áreas, foram impactadas.

Como já havia sido contratada uma construtora para realizar as obras de um novo pavimento (programada para o início de maio), a volta às aulas pode ser mais dinâmica. “Por já estarem com seus equipamentos na nossa escola, em duas semanas e meia, pudemos colocar os alunos em aula. Conforme ia ficando pronto, íamos recolocando as turmas”, lembra.

Para que isso ocorresse, Maria Helena explica que, em primeiro lugar, foi realizado um estudo sobre quais eram as prioridades do colégio. “Assim, trocamos o piso vinílico por porcelanato em todas as salas. Paredes e tetos eram de gesso acartonado, sendo substituídos por alumínio e vidro laminado, entre outras adaptações”, relata.

Para evitar problemas futuros, outros tipos de materiais foram utilizados na reconstrução | Crédito: Colégio Madre Bárbara

Todo esse trabalho foi pensado de maneira preventiva, isso para que no futuro, caso aconteça algum problema, tudo seja mais flexível e de fácil limpeza. “Agora podemos transportar nossos materiais com menos peso e mais rapidez”, afirma.

Na visão de Maria Helena, a enchente serviu para rever alguns paradigmas que precisam ser substituídos. “Criamos uma comissão de enchente, possuímos um arquivo na nuvem em que registramos tudo que aconteceu e o que poderá ser eliminado. Também constam os responsáveis por determinados setores, com contatos daqueles que podem ser acionados”, informa. 

Em busca de captação de recursos

No caso da Escola de Ensino Fundamental São José, de Canoas, as suas instalações também foram severamente alagadas. De acordo com a diretora da instituição, Maria Karina Ferraretto, a água invadiu o primeiro andar de todos os prédios, chegando a quase um metro de altura em algumas salas, permanecendo inundadas por cerca de 20 dias. 

Após o esforço para limpeza e recuperação, as aulas foram retomadas no dia 22 de maio. “No dia seguinte, a escola foi novamente alagada, obrigando-nos a evacuar os alunos e os funcionários presentes e reiniciar o processo de limpeza e reparo nos dias que se seguiram”, recorda.

Limpeza nos corredores já foi realizada, mas, devido à umidade, não pode ser feita a pintura | Crédito: Escola de Ensino Fundamental São José

Na parte estrutural, as salas de aula e os corredores sofreram infiltrações. Houve danos significativos na praça de brinquedos e na quadra de esportes, e as paredes de todas as dependências do primeiro andar necessitam de reparos. “O que nos conforma é que, pelos menos, conseguimos salvar todo o arquivo de documentos e os livros didáticos dos alunos que estavam guardados na escola”, diz.

Aliado a isso, novos desafios apareceram. No mês de julho, muitos equipamentos eletrônicos e digitais, que pareciam estar funcionando, começaram a apresentar problemas devido à umidade, precisando ser descartados.

A enchente impactou também as famílias dos alunos. Das 168 crianças matriculadas, 47 perderam completamente suas residências situadas nos bairros alagados da cidade e região. Outras 20 crianças, que residem nas proximidades da escola, tiveram suas casas alagadas duas vezes. “Atualmente, 18 alunos estão participando das aulas de forma remota para garantir a continuidade do ensino”, contextualiza.

Essa combinação dos impactos da pandemia e das enchentes resultaram em uma inadimplência, impactando na situação financeira da escola. Outro problema é o não enquadramento em algum tipo de auxílio emergencial (governamental ou privado) pelo CNPJ como associação educacional sem fins lucrativos. “Nem o seguro, que foi contratado por meio de agência bancária, aceitou pagar parte dos prejuízos com a enchente”, alerta.

Para superar esta situação, Maria Karina relata que o colégio está em busca de recursos por meio de doações e parcerias com diferentes entidades. “Procuramos apoio de empresas e instituições, já conseguimos algumas doações de materiais escolares, alguns computadores e alimentos para o refeitório”, conta.

Esta captação financeira será destinada a reparos na infraestrutura e na reposição dos materiais pedagógicos. “Urgimos por recursos para pintura interna e externa e reposição dos pisos da pracinha e da quadra. Além disso, necessitamos recompor o fundo de reserva e o capital de giro da instituição, que são essenciais para estabilizar operações diárias e garantir o pagamento da equipe escolar”, ressalta.

Constituição de comitê de crise

Na capital gaúcha, o diretor do Colégio Concórdia, Sérgio Lutz, relata que o nível da água chegou a 1,70 metros de altura dentro das dependências da instituição. “A inundação atingiu o andar térreo, comprometendo setores administrativos cruciais,  como os da direção, da secretaria, da orientação pedagógica e da sala dos professores. Além destes, a água também invadiu a cantina, a sala de recursos e as salas de Educação Infantil”, contextualiza.

Lutz enfatiza que a infraestrutura do colégio foi significativamente danificada, afetando os equipamentos da usina fotovoltaica, subestação de energia e a oficina de manutenção. “A extensão dos danos resultou em perdas quase totais em todas as áreas afetadas, como a biblioteca, onde perdemos cerca de 20 mil títulos”, lamenta.

Após o recuo das águas, o acesso ao colégio foi restabelecido e uma intensa mobilização foi promovida. Os nove dias de trabalho contaram com colaboradores, associados da mantenedora – a Cooperativa de Trabalho Educacional (Coopeeb) – e famílias. Desta maneira, as atividades regulares foram retomadas no dia 3 de junho. 

Biblioteca após a enchente e como está atualmente | Crédito: Colégio Concórdia

O diretor aponta que os efeitos da enchente afetaram 72% das famílias da instituição de ensino, com 28% destes com suas residências completamente inundadas. Nos meses de junho e julho, o colégio ofereceu a opção de aulas no formato híbrido, permitindo que estudantes com dificuldades de deslocamento pudessem participar normalmente.

A solução encontrada para atender às necessidades urgentes foi criar um comitê de crise, composto por membros do conselho de administração, equipe diretiva, comunicação e outros profissionais. “Desde o início da enchente, este grupo atuou ativamente no apoio a colaboradores e famílias afetadas”, pontua.

Diversas frentes de trabalho foram estabelecidas, demandando grande dedicação e competência das lideranças envolvidas. “Paralelamente, buscou-se apoio de instituições e empresas para doações que pudessem auxiliar a escola nesse momento crítico”, complementa.

Para o diretor do Colégio Concórdia, graças à solidariedade, surgiram diversos voluntários, grupos de apoio e doações, que foram fundamentais para esta recuperação. “Atualmente, a instituição vem trabalhando em sua reestruturação e segue aceitando doações de livros para a reconstrução do acervo da biblioteca, além de mobiliário para as salas da Educação Infantil e do setor administrativo”,  salienta.

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