Autodidatismo é a habilidade do professor do futuro, diz psicanalista
Geraldo Peçanha de Almeida palestrou na 13ª edição do Inteligência Coletiva sobre felicidade e legado na profissão docente
A escritora Lya Luft criou uma das frases mais célebres sobre o início da vida: A infância é um chão que a gente pisa a vida inteira. O psicanalista, pedagogo e escritor Geraldo Peçanha de Almeida parece levar essa frase muito à sério na construção de seu trabalho.
Com um olhar profundo sobre a infância, ele une a clínica à teoria educacional e se tornou um dos grandes pensadores sobre a presença do lúdico na vida dos educadores. No final de setembro, foi um dos palestrantes da 13ª edição do Inteligência Coletiva, encontro idealizado pela Escola de Professores Inquietos, iniciativa do Colégio Farroupilha, de Porto Alegre.
No Teatro da Unisinos, Almeida abordou o tema “O trabalho pedagógico como prática de felicidade: a construção do professor inesquecível”, trazendo reflexões sobre o ofício educativo. Sua proposta central é resgatar o orgulho e a paixão pela docência, além de apontar saídas para que professores tenham como resultado a realização profissional.
Em entrevista exclusiva para o Educação em Pauta, ele fala sobre o perfil do educador do futuro e a importância de apresentar aos jovens as conquistas trazidas pela carreira docente.
Com a crescente discussão sobre a educação do futuro, qual habilidade você considera mais essencial para que os professores desenvolvam hoje?
Eu não tenho dúvidas de que a habilidade mais essencial é o estudo ininterrupto, a capacidade de ser proativo e autodidata. Porque o que nós sabemos agora, o que nós podemos agora, nós não podemos depois e nós não sabemos depois. Hoje, o conhecimento possui uma velocidade quase assustadora. Recentemente, recebemos a informação de que a pressão 12 por 8 é considerada pré-hipertensão. Isso fará com que precisemos nos reinventar. Estou dando um exemplo para mostrar que os nossos conhecimentos vão se diluindo e desaparecendo justamente porque novos conhecimentos vêm. E a escola não consegue acompanhar isso tudo na transmissão. Por isso que a habilidade mais importante para um professor é ele nunca deixar de ser professor. Deixamos de ser professores quando a gente deixa de estudar. O autodidatismo é a habilidade mais importante do futuro.
Você palestrou no evento Inteligência Coletiva sobre o trabalho pedagógico como prática de felicidade. Pode comentar um pouco sobre essa proposta?
O trabalho pedagógico hoje é uma construção. Entrar no magistério querendo ser feliz, realizado e próspero só vai trazer frustração. Mas entrar no magistério com a perspectiva longitudinal, ou seja, entrar numa profissão em que você se permite conhecer aquele espaço, desenvolver o seu ofício e, a partir do momento que você desenvolve isso e aplica tudo que aprendeu, isso sim traz felicidade. A grande frustração no magistério é o profissional entrar querendo ser realizado, querendo já colher coisas que ele tem que plantar, tem que cultivar ao longo da vida.
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Pesquisas apontam que há uma possibilidade de um “apagão” de professores. Porém, alguns jovens ainda sonham se tornar educadores. Qual conselho você daria para um jovem que está pensando em seguir a carreira de professor hoje?
Normalmente, os jovens conhecem a pior parte da profissão de educador. Nós falamos sobre a dificuldade com as famílias, a dificuldade do aprendizado do conteúdo, a dificuldade dos materiais, da dificuldade da estrutura. Mas raramente os educadores falam das suas alegrias da sala de aula, ou seja, da troca de cumplicidade, da troca de olhares, da parceria, da relação afetiva que se constrói entre professor e aluno, dos momentos felizes e das relações de amizade que só a escola oferece. Então, o que seria importante para a gente atrair jovens para a profissão no magistério é falar dos sonhos, das coisas boas e das boas relações que a gente estabelece na escola.
Para você, qual o maior legado que um educador pode deixar para seus alunos e para a comunidade escolar?
O legado de um educador é sempre a sua própria história. A escola é o lugar onde você pode ser quem você é, com algumas dificuldades, mas a escola permite a todos existirem. O educador mais velho, o negro, o gordo, ou seja, todo tipo de pessoa, de ser humano, todo tipo de orientação religiosa, política, sexual, tudo isso é possível, é permitido dentro da escola. A escola é o espaço de maior diversidade e isso é o maior legado. Aprender a respeitar todos, conviver com todos, a entender todos. A tolerância para a convivência com todos.
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