Novo Enem: Inep não divulgará matrizes da 2ª etapa em 2022, diz relatora

Presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE) e relatora do Novo Enem, Maria Helena Guimarães de Castro fala em entrevista sobre o futuro da principal avaliação para ingresso no Ensino Superior do país

por: Italo Cosme | Especial
imagem: Marcelo Camargo / Agência Brasil

Maria Helena Guimarães de Castro é uma das principais peças das discussões para implementar as mudanças no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), previstas para 2024. A presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE) pontua que as novas matrizes de conteúdo a serem exigidas na edição modificada não estão prontas e que a previsão do Ministério da Educação (MEC), segundo ela, é de divulgar a matriz do primeiro dia de prova até novembro – enquanto a segunda segue sem previsão. 

Ainda sem homologação, o parecer do CNE, pelo fato de ser orientativo, difere do estabelecido pelo MEC. 

“O parecer do Enem do CNE está alinhado às discussões que o MEC fez com vários atores e que o Conselho Nacional desenvolveu com vários segmentos”, defende Guimarães.

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil

Presidente da Associação Brasileira de Avaliação Educacional (Abave), ela pontua que desde agosto de 2020 há discussões no CNE em torno do Novo Enem e, de lá para cá, ocorreram 23 audiências. Em março deste ano, o Conselho encaminhou as orientações ao MEC, mas o documento ainda não foi homologado. O Grupo de Trabalho do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) também se reuniu de julho de 2021 a fevereiro de 2022.

Maria Helena Guimarães de Castro concedeu entrevista sobre a Novo Enem para Educação em Pauta. Confira os principais trechos.

Educação em Pauta –  A senhora fala que o parecer ainda não foi homologado. Então, como está o processo de adaptação do Enem? O que ainda precisa caminhar? Quando devemos sentir a mudança da cultura no principal vestibular do país?

Maria Helena Guimarães de Castro – Trata-se de um parecer orientativo. Deverá ser homologado pelo ministro. Agora, praticamente, o documento que o MEC já lançou sobre o futuro do Enem em 2024 já incorpora todas as contribuições do nosso parecer para o futuro do Enem. 

A senhora consegue dar o panorama de como estão as mudanças?

O parecer estabelece, assim como as propostas do Enem 2024 do Inep, que, de acordo com o Novo Ensino Médio, as mudanças ocorram a partir daquele ano. Em 2022 e 2023, o Enem continua como é atualmente. Só a partir de 2024 começam as mudanças. Primeiro, o parecer estabelece que o exame será feito em duas etapas, como está na lei. Na primeira, avalia-se a formação geral básica, que é comum a todos os currículos do Ensino Médio. É a etapa que analisa todas as áreas do conhecimento e os componentes que as integram: linguagens, matemática, ciências da natureza e humanas.

A primeira etapa deverá ter uma abordagem multidisciplinar e ser constituída tanto por itens de múltipla escolha quanto por questões abertas, e deverá estar completamente aderente à Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do Novo Ensino Médio. Portanto, é preciso que o Inep desenvolva e divulgue as novas matrizes do Enem 2024. Até a semana passada (última semana de junho), o Inep informou que deverá publicar a nova matriz para a primeira etapa do Enem 2024 até o fim do ano, provavelmente em novembro.

A segunda etapa deverá ser integrada por quatro provas diferentes, porque esta etapa avalia os itinerários formativos, que são flexíveis. O aluno, no ato da inscrição, deverá escolher apenas uma prova para este dia. Uma avaliação contempla a parte de Ciências Humanas e Linguagens e suas Tecnologias – esta prova está ligada a todos os cursos de graduação mais alinhados a este campo. São as universidades que definem o critério de seleção do Sisu. 

A segunda prova se refere à área de Matemática e Ciências da Natureza. É um bloco de questões mais ligadas às ciências exatas, tecnologias e engenharias. A terceira prova, ou bloco de pergunta, é de ciências da natureza e ciências humanas. É uma prova que está mais ligada aos alunos que desenvolveram projetos de vida mais focado na área da saúde, como medicina, odontologia, fisioterapia, psicologia, fonoaudiologia. Enfim, todos os cursos mais ligados à área da saúde. 

E a quarta prova é voltada para matemática e ciências humanas para atender as áreas de economia, contabilidade, administração, por exemplo. 

Além das questões de conteúdo, há outras orientações, certo?

Isso. Nós também fizemos várias recomendações para que gradativamente o governo e o Inep possam melhorar as avaliações. Incluindo, como as tendências internacionais, o uso de plataformas digitais, no futuro, para todos os alunos.

São conjuntos de recomendações de médio prazo que são importantes para orientar o futuro dessas inovações no Enem. Não é possível fazer todas as mudanças até 2024. Mas é preciso ter um plano gradativo para implementar todas as propostas. Nós também indicamos a necessidade de um comitê de governança, integrado pelo MEC, Inep, Consed, Andifes, Conif, CNE e também um representante do Ensino Superior Particular e outro das escolas de educação básica particular. 

Esse comitê deverá ser divulgado por meio de uma portaria ministerial. O MEC divulgou (segunda-feira, 4/7)  uma portaria sobre isso. A indicação do conselho era no sentido desse comitê de governança ser integrado também por especialistas em avaliação e currículo. Não sabemos se o MEC fará isso ou não. 

Outra proposta nossa foi de que estudantes que optarem por itinerário técnico-profissionais possam ter um bônus, um estímulo, quando se inscreverem para fazer o Enem. Muitas vezes, os estudantes desistem do itinerário técnico-profissional porque pretendem ingressar na universidade. A gente entende que esses itinerários são fundamentais para o desenvolvimento desses alunos. Esse bônus é para estimulá-los a continuarem no curso.

Qual tem sido a dificuldade para divulgar a nova matriz para o primeiro dia de prova?   

A elaboração das matrizes é de responsabilidade do Inep. A autarquia só informou que está desenvolvendo as matrizes para a primeira etapa. E que está preparando, mas não divulgará neste ano de 2022, as matrizes da segunda etapa. Lembrando que a nota do Enem será constituída pelas duas provas. 

A senhora fala que a nova matriz para a segunda etapa só sairá para o próximo ano. Na hipótese de haver uma troca de governo, quais seriam os impactos disso no Novo Enem?

Eu não tenho como saber, não tenho bola de cristal. Eu entendo que o próximo governo vai manter o Novo Ensino Médio, deverá implementar essas mudanças propostas. O Novo Enem está totalmente de acordo com o Novo Ensino Médio. 

A pontuação bônus aos egressos do ensino médio técnico-profissional não cria uma desigualdade na disputa?

Esta é uma sugestão que não está regulamentada. É uma recomendação do CNE. O próprio MEC propõe um incentivo para esses alunos do ensino técnico, desde que escolham, na segunda etapa, uma área correlata ao curso que fizeram. Por exemplo, o aluno que fizer um curso técnico de enfermagem e escolher a área da saúde, ele terá um incentivo. Da mesma forma dos que fizerem eletrônica e escolherem matemática, ciências da natureza, terá um bônus. É a proposta do MEC. A nossa não é bem assim. É um bônus geral. Da mesma forma que acontece hoje com as cotas, é mais um incentivo. 

Esse novo modelo de prova deve contemplar os impactos da pandemia no ensino-aprendizagem? 

Os alunos do Ensino Médio, de acordo com as avaliações já disponíveis, feitas nos Estados, foram os menos impactados pela pandemia, no processo de aprendizagem. Houve impacto grande nos indicadores de evasão e abandono. 

Do ponto de vista do aprendizado, os alunos dos anos iniciais e anos finais do ensino fundamental foram muito mais impactados. Eu acredito que até 2024 esses alunos já terão condições. O Novo Ensino Médio está sendo implementado neste ano. Todas as escolas já estão abertas. Os impactos da pandemia até 2024 já estarão menores. 

Além disso, para os alunos, é estimulante saber que o Novo Ensino Médio trabalha o projeto de vida, a partir da forma dele fazer escolhas, definir as disciplinas eletivas, os itinerários, pensar no futuro e nos seus interesses. 

Os alunos do Novo Ensino Médio terão de desenvolver competências, que envolvem conhecimento, habilidades, atitudes e valores. O Novo Ensino Médio está totalmente alinhado às tendências internacionais. Nos outros países, na maioria dos que têm seleção para ingresso no Ensino Superior, há propostas muito parecidas com as que estamos fazendo aqui.

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