O papel dos pais na retomada ao ambiente escolar depois da enchente

Presentes com ações para reestruturar as escolas, pais têm colaborado também na tomada de decisões dos gestores escolares do RS

por: Eduardo Wolff | eduardo@padrinhoconteudo.com
imagem: Colégio Madre Bárbara, Divulgação

Fundamentais na reconstrução das escolas no Rio Grande do Sul após a enchente, os pais dos alunos demonstraram um grande engajamento para arrecadar fundos, realizar mutirões de limpeza, entre outras iniciativas que permitiram a retomada das aulas. Muitos deles, até antes da calamidade, já tinham um envolvimento maior, inclusive contribuindo na tomada de decisões da gestão escolar.

Os pais têm se organizado de formas diferentes: de uma maneira simplificada e espontânea; por meio de um grupo de pais; ou algo mais robusto, com a criação de uma Associação de Pais e Mestres (APM). Seja qual for o formato escolhido, a proposta é a mesma: ser um braço colaborativo que atue de maneira conjunta e contínua com a direção da escola.

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É possível perceber esse tipo de organização na cidade de Roca Sales, no Vale do Taquari, região bastante afetada pelos efeitos climáticos. O engenheiro civil, ex-aluno e atual presidente da APM do Colégio São José, Glaycon Matheus Cofferri, comenta que, no momento da enchente, houve diversas conversas com a diretoria. “Quando os alagamentos iniciaram, conseguimos pegar as coisas do térreo e da área coberta para levá-las ao andar de cima. Já havia outros móveis mais pesados, que continuaram lá devido à enchente de setembro do ano passado”, recorda.

Após baixar o nível das águas, foi possível acessar o colégio e realizar a limpeza. Havia muita sujeira na biblioteca, em brinquedos, livros, materiais escolares e outros tipos de equipamentos, além do pátio da escola, que estava com muito lodo acumulado. “Utilizamos um maquinário pesado, mas, em alguns lugares, teve que ser limpo manualmente. Também contamos com muita ajuda de voluntários, o que nos trouxe um grande ânimo, porque impactou psicologicamente não só nos estudantes, como também na comunidade envolvida. Todos se sentiam alegres em ajudar”, reforça.

Neste momento pós-enchente, o presidente da APM do São José ressalta que serão necessárias obras de melhorias, que contarão com o apoio de recursos advindos do fundo reserva da associação. “Esse dinheiro é destinado para o futuro, caso aconteça uma nova enchente, para que não se tenha tanto prejuízo. Já fizemos algumas adequações na parte elétrica para amenizar os estragos. Compramos alguns equipamentos, como lava jatos, para ajudar a ter celeridade no retorno das aulas. Além disso, as paredes, antes acartonadas, agora são de tijolos. O piso, antes de madeira, é cerâmico. Enfim, estamos adequando a essa nova realidade”, contextualiza. 

Para Cofferri é muito importante o papel de se envolver com a escola, estar presente, desde buscar o boletim até conversar com a professora e a direção. “Você não pode ficar sem saber das necessidades da escola, o que ela precisa no dia a dia. É necessário ter ciência. Por causa das chuvas, os disjuntores estão ruins, não tem ar-condicionado. O pai precisa ter essa dimensão. Querendo ou não, o seu filho, dependendo da idade, vai entender mais fácil esse tipo de postura, vai adquirir um espírito solidário, uma educação completa”, enfatiza.

No Colégio São José ocorreu um mutirão de limpeza, contando com a participação de pais, colaboradores e voluntários | Foto: Glaycon Matheus Cofferri, Arquivo Pessoal

Já em Lajeado, há oito anos, a relações-públicas Bárbara Kranz está na presidência da APM do Colégio Madre Bárbara. Ela destaca que, em todas as ações que a instituição de ensino necessita de auxílio, a APM está sempre à disposição. “A gente sabe que, embora seja uma escola particular, tem uma certa demanda de necessidades, que, muitas vezes, vão além do orçamento feito no início do ano”, afirma. 

Segundo Bárbara, a enchente foi um momento bem desafiador, atingindo um volume de água de cerca de três metros dentro da escola. Para todos, foi algo bem surpreendente, pois, até então, nunca havia acontecido algum tipo de alagamento dentro do Madre Bárbara. “Colocamos o nosso grupo para ajudar e quando começou a se anunciar que a água iria chegar ao colégio, juntamos o pessoal para fazer a retirada de alguns materiais e subir outras coisas”, relata.

Após a enchente, ela ressalta que, ao chegar à escola, foi possível entender um pouco os impactos sofridos. “Para a limpeza, havia grupos de pais que iam durante o dia, outros no fim do dia. Não eram só pessoas da nossa associação, mas sim a nossa comunidade”, lembra.

Bárbara comenta que houveram períodos distintos nos retornos dos alunos às aulas. Primeiramente, foram liberados os ambientes onde ficam os estudantes dos anos iniciais e do Ensino Médio e, posteriormente, retornaram os da educação infantil. “Teve todo esse trabalho de acompanhar os pais, de fazer entenderem que sim, a escola precisava se reestruturar e reorganizar para conseguir receber as crianças da melhor forma possível. Ver a escola linda, como ela está, depois de tudo isso que a gente passou, foi muito emocionante”, celebra.

Na sua visão, a APM também serve de exemplo aos estudantes. “O meu filho mais velho participou de alguns dias da limpeza da escola. Teve um dia que chegou em casa todo sujo de lodo e eu disse: ‘mas olha Antônio, que orgulho, participando ativamente da limpeza da escola’. E ele me respondeu: ‘é mãe, tenho por quem puxar, tenho em quem me inspirar”, conta.

A presidente da associação do Madre Bárbara salienta o intenso envolvimento e o apoio constante. Muitas vezes, a equipe diretiva procura a associação e traz suas demandas prioritárias. “A gente escolhe uma escola para ser nossa parceira na formação dos nossos filhos. Precisamos escolher lugares que tenham a mesma convicção, os mesmos valores que temos como família”, diz. 

Para ela, a APM é fundamental também para que outros pais estejam mais presentes no universo da escola. “Muitas vezes, os pais têm dúvidas, querem mais informações e nos procuram primeiramente. Fazemos essa ponte, essa conexão com a direção. A nossa ideia é envolver todos os pais”, aponta.

Pais incentivam seus filhos (e alunos) a ajudarem a limpar cadeiras e mesas no Colégio Madre Bárbara | Foto: Bárbara Kranz, Arquivo pessoal

Em Montenegro, o Colégio Sinodal Progresso conta com um Grupo de Pais Representantes, liderado, desde 2019, pela dona de casa Juliana Closs Herbert. “Participo de reuniões, levo sugestões, críticas e esclareço dúvidas. E, para facilitar a comunicação, existe um grupo de WhatsApp organizado pela escola. É por esse canal que os assuntos do dia a dia são tratados”, explica.

Quando a cidade recebeu o alerta de enchente, de acordo com Juliana, muitos pais se colocaram à disposição da escola para ajudar na organização do que fosse necessário naquele momento. “Assim que a água baixou e foi possível ingressar na escola, vimos um cenário muito triste, de sujeira e destruição. Em um primeiro momento, esvaziamos as salas de aula, separamos o que poderia ser lavado e reaproveitado e descartamos o que estava estragado. Em seguida, começamos a lavar tudo”, relata.

Aqueles pais que não puderam estar presentes no dia da limpeza, buscaram brinquedos e outros materiais para lavar em casa. Alguns doaram materiais e recursos financeiros, outros fizeram a troca dos pisos danificados pela enchente. “Cada um fez o que estava ao seu alcance no momento”, pontua.

Juliana comenta que ficou feliz ao ver a escola cheia no primeiro dia de aula pós-enchente. “Para mim, isso significa que os pais confiam que a escola faz o melhor possível sempre e que continuará fazendo. Acho que a escola percebe essa confiança e essa relação entre as partes é fundamental nesse momento de retomada”, diz.

Quanto ao grupo de pais, ela salienta que é bastante dedicado e envolvido com o ambiente escolar. “É importante os pais participarem ativamente, porque a educação de uma criança não se dá apenas na escola ou em casa, mas, principalmente, nesses dois ambientes. Acredito que a participação dos pais traz um olhar diferente, complementar. Na nossa escola os pais têm a chance de apresentar suas percepções e isso é fundamental para uma resposta rápida no manejo de situações no ambiente escolar”, ressalta.

Após os mutirões, foi possível retornar às aulas no dia 20 de maio:

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E o que pensam os gestores escolares destas escolas?

Para a diretora do Colégio São José, Rosane Inês Volken, em diversas situações, sejam em festas temáticas ou até na aquisição de um equipamento de climatização, houve cooperações da APM. “Mantemos um canal de comunicação bem interessante com eles, temos um aplicativo que é uma agenda digital em que todas as informações da organização e da reorganização das atividades foram enviadas de imediato para as famílias”, comenta.

Segundo a diretora do Colégio Madre Bárbara, Maria Helena Jacques, a APM é um elo dentro da engrenagem que fortalece as decisões da gestão escolar, sendo que, inclusive, em decorrência da calamidade, possui representantes na comissão de crise da instituição de ensino. “Assim, podemos mantê-los bem informados com a educação pedagógica, como funciona os investimentos realizados e quais são os objetivos. Então, temos este respaldo e confiabilidade”, afirma.

O diretor do Colégio Sinodal Progresso de Montenegro, Lório José Schrammel, reforça que o grupo de pais é um verdadeiro parceiro, principalmente por ser muito ativo, dedicado e pronto para ajudar. “Em todos os momentos de enchente, a meta  sempre foi voltar com as aulas o quanto antes e com a máxima segurança. Para isso, os pais foram decisivos, pois não mediram esforços para auxiliar a escola em tudo que fosse necessário. Para o retorno, deixamos disponível para a comunidade escolar os laudos de segurança, de engenharia civil, da vigilância sanitária e da engenharia elétrica”, diz.

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