A experiência musical deve ser compreendida e valorizada em sala de aula
Músico e compositor Rodrigo Nassif defende a educação musical nas escolas e a valorização do ensino no país
Rodrigo Nassif
Músico e compositor. Vencedor do Prêmio Açorianos e presente em diversas listas de Melhores do Ano no Brasil e no exterior. Já tocou em diversos países como EUA, Inglaterra, França e Argentina. Foi bolsista do Conservatório Luís Gianneo, em Buenos Aires, onde cursou mestrado de performance em violão.
Estou em casa e me preparo para ver uma série em um canal de streaming: a ação perde seu ritmo vertiginoso assim que tiro o volume da televisão para atender ao celular. No cinema, salta aos ouvidos o efeito dramático da presença da música para reforçar o efeito que o roteiro irá causar na audiência. Vejo um desenho animado e passo o resto do dia com o tema da abertura ecoando na cabeça. O que todas estas situações têm em comum?
A presença da música em nossas vidas vai muito além do entretenimento. A música tem uma verdadeira função social na vida em sociedade: ela anima as torcidas nos estádios, consola as crianças nas creches, empresta seu ritmo para consolidar a ideia de coesão social (em toda revolução existe uma quantia enorme de hinos que surgem como fator identificador), mantinha, até mesmo, o alento mais íntimo dos trabalhadores nas worksongs, que deram origem ao blues e mantiveram viva a herança cultural dos ritmos oriundos da África em toda América.
Ao ouvinte mais atento se abre a oportunidade de adentrar em um mundo de lógica impecável e de precisão matemática. Quando se tem a chance de apreciar devidamente uma composição de qualquer estilo, de qualquer parte do mundo, lá está o essencial invisível aos olhos: forma e estrutura, disciplina necessária para dar vida a mais elementar das composições, presença atenta, sentido estilístico alerta, vivacidade rítmica, percepção elementar de repetições e contrastes – que dão ao ouvinte a sensação de perceber algo que pode surpreender e, mesmo assim, ser conhecido.
A experiência musical é algo indissociável do ser humano e necessita, mais do que nunca, ser compreendida e valorizada dentro da sala de aula. Os países com melhores notas nos rankings internacionais de qualidade educacional têm em comum a valorização da educação musical. Poucas atividades requerem um grau de concentração tão grande quanto aprender um instrumento musical – até mesmo nos seus níveis mais básicos. Quem já tentou aprender uma música em um violão saindo do zero sabe muito bem do que estou falando aqui.
A atividade musical é ao mesmo tempo física, mental, intuitiva e cerebral. A valorização do ensino musical em um país como o nosso é extremamente necessária. O Brasil tem competências extraordinárias reconhecidas pelo mundo inteiro e tão pouco compreendidas em nosso país.
Trabalhei exclusivamente como professor de música em salas de aula do Ensino Médio e poucas experiências foram tão surpreendentes e gratificantes em minha vida profissional como este período. A certeza que carrego comigo daqueles anos é que as oficinas de percepção musical foram experiências que os ex-alunos realmente irão levar para a vida toda.
Mesmo tanto tempo depois, toda vez que um deles tem a chance de me encontrar, é comum eu ouvir: “Professor, a gente sabe que tu é compositor agora, mas não esquece que a gente aprendeu a ouvir música contigo.”
Ao mesmo tempo que isso muito me orgulha, me preocupa a necessidade urgente de melhorias no ensino musical em nosso país.
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