O desafio de oportunizar espaços para o protagonismo juvenil

Para assessora pedagógica do Colégio Farroupilha, é preciso criar condições saudáveis de convivência entre a escola e os alunos

imagem: AdobeStock

Marília Dal Moro Bing

Assessora Pedagógica do Colégio Farroupilha

Durante o ano passado, tive a oportunidade de acompanhar um grupo de professores do Ensino Médio em um processo formativo construído em contexto, priorizando problemáticas trazidas por eles. Embora muitos desafios tenham se apresentado,  um deles parecia sempre voltar ao centro de nossas conversas: como promover o engajamento dos estudantes, comprometido principalmente após a pandemia? Como motivá-los a estar na escola?  

Ao elaborar este texto, lembrei-me de um artigo da professora Maria Luiza Xavier, da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que me parece muito atual, apesar de haver mais de 10 anos desde sua publicação. A autora traz uma discussão sobre as inúmeras juventudes que adentraram as escolas nas últimas décadas e sobre a necessidade de repensar os conhecimentos e saberes que fazem sentido para os jovens. A depender da sua conjuntura, os estudantes têm anseios e necessidades diversas. Frequentam a escola não apenas para aprender o que é curricular, mas também para buscar respostas para suas vidas, tensionando o que oferecemos, a fim de encontrar espaços que possam chamar de seus (XAVIER, 2010).

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Ainda de acordo com a autora, a escola contemporânea é aquela que atua como um ambiente de encontros das culturas infantis e juvenis, sem deixar de garantir o compartilhamento de conhecimentos historicamente construídos pela humanidade. As instituições precisam acolher, de forma genuína e respeitosa, o que as juventudes plurais vêm nos mostrando, ensinando-as a como estabelecer uma negociação saudável entre o que é interessante para elas e o que é premissa do processo educacional – interessante para nós.

Nessa perspectiva, ressalto um aspecto que nos é caro: na prática escolar atual, considerando a extensão do currículo a cumprir, como criamos condições saudáveis de convivência entre as culturas juvenis e escolar? A resposta não é única e cada instituição precisa compreender o que é possível realizar em seus contextos. No Colégio Farroupilha, escola em que atuo, em Porto Alegre, um projeto nesse sentido tem gerado bons frutos. 

Em 2022, a iniciativa chamada “Clubes e Grupos de Aprendizagem como incentivadores do protagonismo estudantil” foi premiada na categoria Estudante Protagonista, nos Prêmios do Sinepe/RS. Esse projeto, que compõe o currículo complementar, busca oferecer ao estudante oportunidades de desenvolvimento em diferentes áreas, de acordo com seus interesses, contribuindo para que empreendam os seus projetos de vida. 

Ao longo do ano letivo, são oferecidos Grupos e Clubes de Aprendizagem, sem custo adicional, no contraturno, aos estudantes dos Anos Finais e do Ensino Médio, sob orientação de educadores da escola e alicerçados em uma abordagem metodológica que tem o protagonismo estudantil como premissa. São espaços para a prática de diferentes saberes, além das experiências do currículo comum. Os estudantes podem escolher entre 14 opções, como Clube de Teatro, de Comunicação, de Relações Internacionais, de Astronomia, de Ciências e de Química, Grupo dos Inovadores, de preparação para exames de proficiência de línguas estrangeiras, Grow Cube – Incubadora de Negócios, Voluntariado, etc. São grupos compostos por estudantes de diferentes idades e com interesses em comum.

Sendo assim, vejo estudantes gradativamente mais autônomos, com desejo de deixarem sua marca para além da escola, resolvendo problemas de frentes inúmeras, tomando decisões e criando novos propósitos para si. Para isso, é preciso investimento, tanto financeiro quanto de escuta ativa dos jovens. 

Somente no último ano, três novos Clubes e Grupos foram criados, um deles por autoria dos próprios estudantes que tinham o desejo de jogar RPG (Role-Playing Game) na escola. No Clube, intitulado “Arcanos: Clube de Aprendizagens com RPG”, os mestres das histórias são os estudantes mais experientes, que buscam, com o apoio dos educadores, conectar as histórias narradas com os conhecimentos curriculares. Há conexão mais potente da cultura juvenil com a escola do que nesse caso? 

Ouvir o jovem de maneira genuína não é fácil. Geralmente, eles não nos trazem demandas de simples resolução. Se precisamos, ainda, garantir um currículo sólido para todos – e sempre precisaremos –, que possamos aos poucos construir com eles o que os conecta, engaja e os deixa felizes, compartilhando conosco o propósito de estar na escola. 

Referências:

XAVIER, Maria Luiza M. F. Escola contemporânea: o desafio do enfrentamento de novos papéis, funções e compromissos. In: BUJES, Maria Isabel; BONIN, Iara Tatiana (org.). Pedagogias sem Fronteiras. Canoas: Ed. Ulbra, 2010. p. 93-104.

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