Como ampliar o pensamento criativo nas escolas

Apesar de existirem iniciativas que trabalham com a competência no Brasil, profissionais da educação reforçam a necessidade de mudanças. País aparece em 49ª de um ranking com 64 nações avaliadas pela OCDE

por: Eduardo Wolff | eduardo@padrinhoconteudo.com
imagem: Freepik (imagem gerada com IA)

Dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) atestam que o desenvolvimento do pensamento criativo nas escolas brasileiras não é nada satisfatório. Em seu Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), a instituição inclui o tema “Mentes criativas e escolas criativas”. Nele, avaliou 64 países que integram a criatividade nos currículos escolares, a fim de formar cidadãos capazes de explorar novas perspectivas para solucionar problemas de maneira original e eficaz. O Brasil ficou apenas na 49ª posição, resultado significativamente abaixo da média da OCDE.

Ideias criativas são fundamentais para o avanço da sociedade, como um todo, uma vez que o mundo vem passando por uma série de transformações e apresenta problemas complexos, que necessitam de soluções não convencionais e inovadoras. Diante disso, a escola desempenha um papel importante, pois potencializa as competências, principalmente nos jovens, como abertura ao novo, resiliência, criatividade, empatia e engajamento. 

É o que pensa a coordenadora pedagógica da Instituição Evangélica de Novo Hamburgo (IENH), Gabriella Schorn, avalia sobre a necessidade do Brasil em adotar práticas que envolvam o pensamento criativo em um ambiente escolar. Tendo em mãos estes dados do PISA, Gabriela acredita que isso não se trata apenas de inventar algo novo, mas sim de reconfigurar ideias e solucionar problemas de maneiras diferentes e inovadoras. A partir disso, reflete-se o papel da educação e em como vem conduzindo os processos de construção do conhecimento. 

Rever atuação de alunos e professores

Na visão de Gabriella, a criatividade aliada à curiosidade exige ambientes que estimulem a exploração e o questionamento. A sala de aula deve ser um espaço fértil, vendo o “erro” como potencial de transformação. “À vista disso, a cocriação entre estudante e docente envolve uma construção conjunta de conhecimentos, habilidades e atitudes, desenvolvendo uma relação de confiança e respeito. É onde o docente atua como facilitador, orientando o estudante na investigação de um tema ou na resolução de um problema real”, pontua.

Para a professora dos Cursos de Licenciaturas das Faculdades Integradas de Taquara (Faccat), Carla Silveira, é imprescindível que haja mudanças. Isso tanto de concepções quanto do papel de atuação dos estudantes, sejam crianças, adolescentes e adultos, dentro do processo educativo.

Ela acredita na ressignificação destas vozes de atuação e participação e, por consequência, uma revisão do processo de ensino e aprendizagem. “É preciso desenvolver um trabalho mais focado com metodologias ativas e participativas, com o projeto científico desde os alunos muito pequenos para que possa estar atrelando o ensino e os conteúdos às vivências cotidianas”, salienta.

De acordo com Carla, o processo de cocriação, de mediação ou de aprendizagem mútua e a relação entre professor e estudante se funda em um elemento em que o docente também se coloca como um aprendiz. “Quando se trabalha por projeto de pesquisa, esse professor busca novos conhecimentos de cunho social, resgata saberes que, por vezes, não são tanto do cunho técnico, mas sim, saberes da comunidade”, conta.

Já a consultora de inovação Caroline Bucker analisa que, atualmente, as crianças possuem uma visão geral do mundo. Além disso, a suas inteligências emocionais estão mais diferenciadas. “Os formatos da educação mudaram e o ideal é que alerte para algo que envolva a colaboração”, recomenda.

Para exemplificar, Caroline lembra que ficou à frente de um projeto para o Sebrae/RS, o Workshop Professor Empreendedor, que contou com a participação de cerca de 300 mil alunos de escola pública. “Os professores passaram a propor conteúdos que foram cocriados e construídos com os alunos, o que estimulou a curiosidade. É um processo em que a criatividade se instala e é exercitada”, explica.

Criada a partir de uma parceria entre a Fundação Lemann e o Massachussets Institute of Technology (MIT), a Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa (RBAC) é um movimento de educadores, artistas, pais, pesquisadores, empreendedores, alunos e organizações que incentivam uma educação transformadora por meio da aprendizagem criativa, fomentando projetos que atuem neste sentido. O fundador da rede, Leo Burd, comenta que a rede adotou o modelo chamado 5Ps (Projetos, Paixão, Pares, Pensar Brincando e Propósito).

Para Leo, os alunos a estarem incluídos neste sistema (sendo que a escola pode realizar o cadastro no portal da RBAC e acessar exemplos disponíveis ou contratar serviços da RBAC, como formação docente), possuem a oportunidade de construir algo significativo, seja um carrinho, um poema ou um programa de computador. Ainda mais quando incentivados a trocar ideias com outras pessoas e a explorar os materiais e conceitos envolvidos no projeto de forma livre e descontraída. “As iniciativas se tornam ainda mais relevantes e enriquecedoras quando vão além do crescimento individual e situam o aprendizado no contexto social, cultural e ambiental em que vivemos”, acrescenta.

Métodos que podem ser aplicados

Gabriella acredita que é possível provocar a mudança por meio do investimento em formação continuada. Também salienta a inclusão de metodologias diversificadas, que possam potencializar o pensamento criativo como Aprendizagem Baseada em Problemas (APB) e Sala de Aula Invertida. “Permite aos estudantes explorar o assunto em estudo de forma autônoma antes de aprofundá-lo em sala”, ressalta.

Ela reforça que a inovação deve ser vista como um potencial motivador. “A incorporação de tecnologias digitais e o estímulo ao uso de ferramentas criativas, além de proporcionar experiências práticas, problematizadoras e diferenciadas, são formas de engajar os estudantes. É preciso desenvolver o pensamento criativo, independente do contexto em que estiver inserido”, argumenta.

Conforme Carla, a metodologia de projetos pautada em problematizações, que são, às vezes, desde situações do cotidiano até problemas sociais, econômicos e culturais, devem ser mais permeados, sendo um fio condutor do processo de ensino e aprendizagem. “Trabalhar por situações de problemas convida os alunos a buscar estratégias para soluções de problemas”, ressalta. 

Em linha de raciocínio semelhante, Caroline complementa que os momentos de criatividade precisam ser mais frequentes na escola. Ela sugere a técnica do design thinking, bem presente no meio corporativo, e a aprendizagem por projetos, tudo em vista para estimular a criatividade. 

Ao trabalhar nas escolas com o design thinking, Caroline realizava o processo em quatro etapas: empatia, identificação de um problema, ideação criativa e prototipagem. “A aprendizagem por projeto pega essa prototipagem e transforma em um projeto. Os alunos que vão definir um cronograma, em que aplicarão. É um trabalho mão na massa”, complementa.

Um exemplo deste tipo de trabalho aconteceu no Colégio Evangélico Alberto Torres (CEAT) em Lajeado. A partir do projeto Aluno Pesquisador, o colégio fomenta a prática da investigação científica, como abordar temas sobre pássaros em extinção, análise de agrotóxicos, entre outras ações relacionadas à região do Vale do Taquari. “Fui jurada desse projeto, é bem interessante. Eles que decidem o que querem fazer e trouxeram assuntos muito relevantes”, declara.

Segundo Leo, existem algumas iniciativas que visam o pensamento criativo no país e que podem ser replicadas em várias escolas. Ele cita que no portal da RBAC estão disponíveis experiências compartilhadas, com centenas de planos de aulas e que podem servir de inspiração. 

Outra dica é o uso de aplicativos, como o OctoStudio, que estimula a programação para crianças. A ferramenta foi criada pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em parceria com a RBAC. “Pode criar joguinhos, arte interativa, histórias, usando a programação em blocos. Além disso, os personagens e os fundos de tela foram pensados com a realidade do Brasil. Temos exemplos até de comunidades de escolas em comunidades indígenas que criaram programinhas com a voz a partir do idioma deles”, lembra.

Mais uma opção é participar de eventos que estimulam a temática do pensamento criativo. Um deles são os Festivais de Invenção e Criatividade (FICs), promovidos pela RBAC. Neste evento, crianças, jovens, familiares e educadores têm a oportunidade de explorar materiais e tecnologias, participar de atividades e conhecer um aprendizado estimulante, interessante, significativo e mão na massa. “Com apoio da organização da rede, os FICs são organizados por voluntários de todo o país, tendo sempre como sua principal atividade a Mostra Interativa”, complementa.

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