Como um bom prompt pode transformar a escola
Pesquisadores da área de tecnologia educacional apontam caminhos para instituições de ensino garantirem boas respostas das ferramentas de IA
ChatGPT, Google Gemini e Claude estão entre as plataformas de inteligência artificial generativa mais populares atualmente. Profissionais de diversas áreas utilizam esses recursos para criar e revisar textos, imagens, planilhas, além de organizar atividades práticas e listas de tarefas. Para isso, é necessário fornecer comandos específicos às plataformas, conhecidos como prompts. Esses comandos vêm ganhando atenção crescente entre pesquisadores de IA, pois um prompt bem elaborado pode garantir resultados mais precisos e eficazes, e isso se aplica também à educação.
Para começar, o Educação em Pauta levou o seguinte prompt para um chatbox de inteligência artificial:
O que são prompts educacionais e por que isso importa?
A resposta recebida foi essa:
Prompts educacionais são comandos ou instruções específicas que você dá a uma inteligência artificial generativa para que ela produza um conteúdo útil e direcionado ao contexto da educação.
Partindo dessa breve explicação, fomos para o método mais tradicional de execução de uma reportagem, que é ouvir um especialista no assunto. O pesquisador, professor e consultor de metodologias ativas e tecnologia educacional Fernando Trevisani tem vasta experiência na formação de professores e um olhar atento para as possibilidades trazidas pelas tecnologias digitais. Tanto que sua pesquisa de doutorado na Universidade Estadual Paulista (Unesp) aborda como professores podem utilizar recursos de IA generativa para o planejamento de aulas dentro dos modelos das metodologias ativas e do ensino híbrido.
No caso dos planos de aula, existem modelos de prompt que garantem saídas mais completas. O professor tem a possibilidade de criar atividades e até uma lista de exercícios, classificando as perguntas das mais fáceis para as mais difíceis, garantindo uma avaliação da progressão do aluno. “Para alunos de inclusão, é possível personalizar os planos de acordo com as capacidades de cada estudante. Para a gestão não é diferente. Professor e gestor podem analisar dados juntos para construir propostas personalizadas para cada turma”, explica Trevisani.
O uso dos prompts corretos também podem colaborar na relação família e escola. Isso porque é possível criar comunicados e até modelos de tarefas de casa que ajudam a fortalecer a troca entre pais e filhos. “Projetos institucionais também podem ter um desenvolvimento mais certeiro a partir da ajuda da inteligência artificial, já que os dados são avaliados e organizados em um tempo menor do que se fosse realizado de forma manual”, lembra o professor.
Investir em conhecimento é a chave para desenvolver uma habilidade conhecida como literacia de prompts, que diz respeito à qualidade de ser letrado na elaboração desses comandos. Trevisani lembra que já existem pesquisas que mostram que a qualidade de elaboração de um prompt faz muita diferença para os resultados obtidos, independentemente das plataformas utilizadas. E, ao contrário do que muitos pensam, criar um prompt não é algo intuitivo. “É preciso estudar. Dentro da minha pesquisa, a falta de dados dos alunos, das turmas e até das escolas prejudicam o diálogo do professor com a IA”, aponta.
Pesquisador Fernando Trevisani acredita que a formação de professores deve investir cada vez mais em temas ligados à tecnologia para que os educadores possam entender e criar com mais assertividade | Créditos: Arquivo pessoal
Parte desse conhecimento em prompts pode ser adquirido por meio de cursos voltados para o assunto, que têm se tornado cada vez mais comuns em plataformas de educação. O Instituto Crescer, por exemplo, lançou três cursos, em formato de fanzine, abordando questões tecnológicas, entre elas o uso de IA generativa para desenvolvimento de recursos digitais específicos para a sala de aula.
Durante a Bett Brasil, o maior evento de inovação e tecnologia para a educação da América Latina, Fernando Trevisani defendeu a força da autoria docente a partir do uso de IA. Para ele, tal tecnologia não irá substituir o trabalho do professor, mas pode ampliar a capacidade do educador a partir do uso inteligente dos prompts, que funcionam como assistentes de cocriação pedagógica. “O primeiro comando parte do professor. Professores com décadas de experiência raramente incluem as atividades já utilizadas em sala de aula na criação de um prompt. A IA é coautora, o professor constrói com ela os planos e atividades”, diagnostica o pesquisador.
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Leitura, atualização e investimento de tempo e energia nas experimentações de diferentes plataformas de IA generativa já estão fazendo parte da formação de muitos professores e gestores. Porém, enquanto otimiza o tempo e permite que esses profissionais se dediquem a outros pontos do trabalho com mais integridade, também se forma um cenário onde a IA pode assumir tarefas que envolvem a memória e a criação. Então, vale perguntar:
Como os prompts podem ser usados para estimular o pensamento crítico e a criatividade dos alunos, em vez da mera reprodução de informações?
Para a inteligência humana de Trevisani, a resposta pode estar nas metodologias ativas. Para isso, é importante que haja um investimento por parte do professor em experiências de aprendizagem que vão além da memorização de fórmulas ou datas. Promover debates, apresentações e discussões acerca de um problema facilita a retomada dos conceitos aprendidos no momento de uma avaliação. Nestes casos, a IA pode colaborar como um recurso extra para o desenvolvimento das trocas com os colegas.
Um exemplo observado pelo pesquisador se deu em um projeto em que alunos do 8º ano de uma escola interagiram com uma IA programada para simular um médico em um cenário histórico de surto de doenças. “A inteligência artificial, baseada em dados fornecidos pelo professor da disciplina, respondia as perguntas dos alunos, incentivando-os a avaliar as decisões governamentais da época. O objetivo era criar uma experiência imersiva que permitisse aos alunos vivenciarem o problema histórico e desenvolver um entendimento mais profundo”, lembra Trevisani.
Em seu perfil no Instagram, que conta com quase 30 mil seguidores, Trevisani compartilha várias propostas de atividades e também as principais novidades tecnológicas envolvendo a educação. Uma delas, que já foi tema de reportagem aqui no Educação em Pauta, é o guia lançado pela Unesco abordando a formação de professores com foco na IA e na ética. Para o pesquisador, as escolas vão assumir um papel central na discussão do uso ético e responsável da IA. E esse debate deve começar na formação de professores, seja dentro dos cursos de licenciatura quanto na formação continuada.
Para os professores que já estão atuando, ele orienta sobre a importância de módulos específicos sobre ética digital e como é possível que eles estimulem o uso consciente por parte dos alunos. Algumas instituições, inclusive, já estão elaborando diretrizes específicas para o uso de recursos de IA, que abrangem educadores e alunos. “Elas devem ser claras, objetivas, elaborando, por exemplo, um código de conduta do que é aceito ou não pela escola no que diz respeito à IA”, indica Trevisani.
O pesquisador Carlos Alberto Coletto Burger defendeu recentemente sua dissertação de mestrado, fruto de uma pesquisa que analisa a evolução histórica das tecnologias educacionais e os seus impactos nas práticas pedagógicas. Formado em publicidade e Sistemas de Informação, ele acredita que as instituições devem investir em um conhecimento pré-prompts para garantir um uso benéfico da IA. Entender como funciona um computador e, por consequência, a lógica dos algoritmos, desenvolve o pensamento lógico e torna tudo mais orgânico na relação homem-máquina.“É uma relação em formato de diálogo, e a construção de contexto é essencial. Muitas vezes, a ferramenta pode trazer perguntas para o professor, buscando informações dele para gerar uma resposta mais adequada”, explica Burger. Para ele, apesar de otimizar o tempo de trabalho, a criação de materiais e atividades junto com a IA exige dedicação. “A validação humana é fundamental para garantir a qualidade do trabalho e a criatividade, especialmente porque a IA não possui ‘corporeidade’ nem senso de absurdo, exigindo que o ser humano filtre e selecione o que é válido”, conclui.
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