Desigualdade e clima, o elo invisível que desafia o futuro
Às vésperas da COP30, o professor francês Alfredo Pena-Vega analisa como as desigualdades sociais e econômicas ampliam a crise climática

*Alfredo Pena-Vega, professor-pesquisador do Laboratório de Antropologia Política da École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS/CNRS) e diretor Científico do Pacto Global da Juventude pelo Clima
A questão da desigualdade social em relação às mudanças climáticas não é nova. O economista Thomas Piketty argumenta que o mundo não será capaz de desacelerar o aquecimento global sem abordar simultaneamente a desigualdade econômica e social. Este tema central tem sido marginalizado há muito tempo nas discussões sobre a crise climática, que têm sido dominadas por abordagens científicas e modelagem de emissões de gás carbono.
Além disso, durante os debates eleitorais nos Estados Unidos, o segundo país mais poluente do planeta depois da China, as mudanças climáticas não ocuparam um lugar significativo, revelando a baixa prioridade política dada a esta questão, que, no entanto, é crucial para o futuro coletivo.
Podem-se distinguir duas abordagens principais na análise econômica da crise climática. A primeira, destacada por Thomas Piketty em sua obra Natureza, cultura e desigualdades: Uma perspectiva comparativa e histórica, interessa-se pela dimensão estrutural das desigualdades e pela forma como elas moldam a distribuição das responsabilidades e vulnerabilidades diante das mudanças climáticas.
A segunda abordagem, mais enraizada no campo da economia aplicada, concentra-se nos efeitos das mudanças climáticas sobre a atividade econômica, seja na produtividade, nos mercados financeiros ou nos custos de adaptação. Essa perspectiva, ilustrada especialmente pelos trabalhos de Bilal e Känzig (2024), enfatiza uma visão mais pragmática e instrumental da crise, concebida principalmente sob o ângulo de seu impacto econômico imediato.
O que nos interessa aqui são os desafios que o pensamento econômico deve enfrentar diante das desigualdades geradas pelas mudanças climáticas. De fato, o documento publicado em 2016, pelo Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas (UNDESA), já destacava as principais questões enfrentadas pela comunidade internacional, com base em dados de uma ampla pesquisa socioeconômica mundial.
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Entre as constatações mais significativas, o relatório ressalta que a resiliência às mudanças climáticas pode representar uma oportunidade para reduzir as desigualdades. No entanto, ele também evidencia um círculo vicioso: os impactos das mudanças climáticas e as desigualdades estruturais se alimentam mutuamente. As fortes disparidades no acesso a recursos físicos e financeiros, a desigualdade no acesso aos serviços de saúde, à educação e a empregos de qualidade, assim como as desigualdades de representação política e social, contribuem para aumentar a vulnerabilidade de amplos segmentos da população diante dos eventos climáticos adversos.
Como destaco no meu livro, Os Sete Saberes Necessários à Educação Sobre as Mudanças Climáticas, longe de ser apenas um problema ambiental, a mudança climática aparece como um fator amplificador das desigualdades sociais e econômicas preexistentes, exigindo uma reflexão renovada sobre justiça e redistribuição em escala global.
Além disso, a ideia de que os países mais ricos seriam os principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa, que causam as mudanças climáticas, merece hoje ser relativizada. De fato, as desigualdades nas emissões já não se limitam à distinção entre países desenvolvidos e emergentes: os indivíduos mais ricos dos países em desenvolvimento agora emitem quantidades de gases de efeito estufa muito superiores às das populações mais pobres, contribuindo assim para o agravamento das desigualdades globais.
Nesse contexto, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) constituem um marco essencial de ação. O ODS 10 visa reduzir as desigualdades em todas as suas formas, enquanto o ODS 13 conclama à adoção de medidas urgentes para combater as mudanças climáticas e fortalecer as capacidades de adaptação e resiliência das sociedades frente aos seus efeitos.
Embora os vínculos entre mudanças climáticas e desigualdades estejam hoje claramente estabelecidos e integrados ao conjunto dos ODS, sua implementação continua insuficiente. Esse atraso compromete os avanços na erradicação da pobreza, na segurança alimentar e na melhoria das condições de vida das populações. Infelizmente, a inação e a falta de vontade política de muitos governos revelam a dificuldade persistente em enfrentar de maneira coerente e justa os desafios impostos pelas mudanças climáticas.
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