Prós e contras: a Inteligência Artificial aplicada no ensino
Sistemas como o ChatGPT ainda geram muitas dúvidas. Alguns especialistas apontam quais são as boas práticas para melhor aproveitar esses recursos em sala de aula
A Inteligência Artificial (IA) vem ganhando projeção pelo mundo e, no Brasil, não é diferente. Um levantamento da consultoria FrontierView, encomendado pela Microsoft, aponta que a IA pode contribuir para um crescimento de 4,2% do PIB brasileiro até 2030.
Em grande discussão nos últimos tempos, o ChatGPT é uma nova geração de chatbots, uma aplicação que permite que a pessoa interaja em língua natural com o sistema.
Caso você pergunte a esse mesmo sistema o que ele é, vai se definir como: “um modelo de linguagem de grande escala treinado pela OpenAI (empresa desenvolvedora) para gerar respostas automatizadas em linguagem natural para uma ampla variedade de perguntas e tarefas de linguagem”.
A sua aplicação ganhou novos ares e entrou na esfera da educação. Entre as primeiras reações, estão os receios quanto ao mau uso, principalmente, na educação básica. Afinal, essa tecnologia pode ser útil para a aprendizagem de crianças e adolescentes?
Outras dúvidas vieram à tona, como: O que impede um estudante de simplesmente passar as instruções e entregar um trabalho escolar feito por essa ferramenta? Como o aluno vai apresentar uma produção textual a partir da tecnologia de IA?
O conhecimento e o pensamento crítico estão ameaçados?
Conforme comenta o professor da Escola Politécnica e coordenador do Centro de Inovação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Michael da Costa Móra, apesar dos resultados de performance serem surpreendentemente bons até o momento, o recurso apresenta informações e correlações equivocadas. “Por isso, o uso da ferramenta requer muito senso crítico para analisar o que é produzido”, frisa.
Para a pesquisadora em metodologias ativas e aprendizagem ativa e resultados de aprendizagem, Ana Valéria Sampaio de Almeida Reis, a tecnologia pode acrescentar muito ao desenvolvimento de crianças e adolescentes, justamente no pensamento crítico.
Como exemplo, ela menciona que um professor, em atividades interativas com os alunos, pode criar histórias a partir de imagens propostas por eles, enigmas, desafios em que o chat possa sugerir pistas. “Tudo isso associado aos objetivos de aprendizagem e aos resultados esperados. As aulas serão mais dinâmicas e participativas”, projeta.
Os domínios cognitivos de pensamento, dos mais simples aos mais complexos, podem explorar diferentes áreas do conhecimento e incentivar a pesquisa para além do ambiente em que se encontram os alunos. “O conhecimento nunca estará ameaçado, porque o que você conhece estará sempre com você, na sua bagagem de vida, e se pode aprender sempre”, enfatiza.
Ana Valéria questiona em que nível de assertividade e confiança a informação gerada pelo ChatGPT chegará até as pessoas, com quais referenciais e como transformar as informações em experiências. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) já aborda a cultura digital na escola e o uso de tecnologias em favor da aprendizagem.
Segundo a professora do Instituto de Informática da UFRGS e coordenadora da Cátedra Unesco em Tecnologias de Comunicação e Informação na Educação, Rosa Maria Vicari, o sistema apresenta uma performance razoável em vários temas da linguística e das ciências humanas. É um recurso de linguagem que gera textos com introdução, desenvolvimento (incluindo análise) e conclusão.
Para ela, a performance do GPT depende da quantidade de textos sobre um determinado assunto que foram utilizados no seu treinamento. A ferramenta ainda não trata aspectos de sentimentos nos textos que gera. “Certamente, a emoção fará parte de uma próxima versão, pois a tecnologia já existe. Ele também fornece referências bibliográficas”, analisa.
>> Confira o webinar sobre Inteligência Artificial (IA): “ChatGPT — Desafios e Oportunidades para a Educação”, com as participações da Ana Valéria Sampaio de Almeida Reis e da Rosa Maria Vicari
E como as escolas devem se preparar?
Pensar que a IA vai resolver tudo, é uma utopia difícil de se prever. É o que acredita a especialista em educação e tecnologia do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB), Larissa Santa Rosa, que afirma que não se pode erradicar o ChatGPT ou qualquer outro recurso similar que venha a surgir: “é negar a realidade”.
Para isso, é importante garantir a formação continuada de qualidade aos professores que possibilitam melhores tomadas de decisão para essas ferramentas em sala de aula. Na sua visão, somente os educadores darão uso eficaz a esses recursos que podem apoiar e facilitar os processos de ensino. “A tecnologia pode ser um atalho na elaboração das atividades e avaliações”, diz.
Já Ana Valéria sinaliza que a escola deve se manter aberta às inovações. Ainda mais quando se aborda as profissões que ainda não existem e os alunos devem estar preparados para as mesmas. O tema do ensino por competências é não só as cognitivas, mas as socioemocionais, as psicomotoras e as transversais. “Será que as profissões do futuro estarão isentas de tecnologia?”, questiona.
Para a especialista, a tecnologia tem de despertar o que há de mais humano: a pesquisa, a investigação, a curiosidade, a criatividade e a apropriação de saberes com ética, respeito às fontes, uso de linguagem apropriada e contextualizada. Segundo ela, o ChatGPT não conhece os limites entre ética e moral. A preparação da escola parte de quem é e do que a compõe: gestores, colaboradores, professores, alunos, pais, seus espaços, seus ambientes virtuais ou não, sua proposta curricular e seu modelo pedagógico.
“Todos sintonizados para dominar as tecnologias, e não só elas, e usá-las para o desenvolvimento mútuo da comunidade educativa, da criação de um ecossistema de aprendizagem em que se evidenciem as experiências dos estudantes e o impacto que essas experiências geram”, indica.
Em pensamento similar, Rosa aponta que a educação em todos os níveis precisa urgentemente se adequar a novas competências e novas habilidades. Cada dia mais, a tomada de decisão será dividida com as máquinas, sendo preciso aprender a conviver com elas.
Além disso, reforça que os empregos estão mudando. Um aluno pode se formar em um dia e no outro ser substituído por um aplicativo. Existem vários exemplos de transformação no mercado de trabalho, como: Uber, Airbnb, Spotify, etc. Da mesma forma, novas profissões surgem, como: piloto de drone, neurocientistas, engenharia cyborg, entre outras.
Para contribuir com essa realidade, a UFRGS lançou um documento chamado Referencial Curricular para a Inteligência Artificial no Ensino Médio. Neste, o ChatGPT é uma das tecnologias sugeridas para ser utilizado pelos professores em suas aulas.
E o que está por vir?
Móra comenta que mais atualizações e ferramentas estão a caminho. O ChatGPT, que é baseado em um projeto chamado GPT 3.5, tem a sua nova versão, a 4.0, em desenvolvimento. “É de se imaginar que a interação seja de maior qualidade”, sinaliza.
Outras empresas de tecnologias também estão com atenção neste tipo de ferramentas. A Microsoft fez um acordo com a OpenIA e promete uma nova versão do Teams (plataforma de EaD) com tecnologias do ChatGPT. As aulas serão “escutadas” pelo GPT e o mesmo poderá criar um resumo dos principais pontos, gerar listas de tarefas e legendar as reuniões em tempo real para vários idiomas. Já o Google anunciou que vai lançar algo similar, o BARD, baseado no seu projeto LaMDA.
A reportagem do Educação em Pauta questionou o próprio ChatGPT sobre qual seria o seu futuro na educação. A resposta dada foi a seguinte: “é promissor, pois o modelo pode ser usado para melhorar a qualidade e a acessibilidade da educação em todo o mundo. Uma possível aplicação é a criação de assistentes de aprendizado virtuais, que ajudam os alunos a aprender em seu próprio ritmo, respondendo a perguntas, fornecendo feedback e criando exercícios personalizados […] é importante lembrar que o ChatGPT não pode substituir completamente os professores e educadores humanos, mas pode ajudá-los a fornecer uma educação mais eficaz e personalizada.”
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