Ressignificando o papel dos jogos nas escolas

Para especialista em Ciência e Design de Jogos, e co-fundador da edtech Press Start, Rick Menasce, os jogos e suas metodologias deveriam ser usados pelas escolas para atender às necessidades pedagógicas e educacionais de seus alunos

imagem: Adobe Stock

Rick Menasce

Formado em Design pela ESPM, é Mestre em Ciência e Design de Jogos pela Northeastern University em Boston, onde foi responsável pela criação e desenvolvimento do primeiro programa de esportes eletrônicos da universidade. É fundador da Press Start, edtech que busca ressignificar o papel dos jogos na educação, professor de jogos no Colégio Israelita e organizador da Liga Intercolegial de Esports.

Um dos maiores desafios enfrentados hoje pelas escolas é a falta de engajamento dos alunos para um modelo de ensino ultrapassado, criado na era industrial para desenvolver trabalhadores de fábrica. Com a rápida evolução tecnológica dos últimos anos, e principalmente o advento de inteligências artificiais mais capazes e disponíveis para todos, as escolas têm se visto em apuros. 

“Nas escolas, os jogos, bem como suas metodologias, deveriam ter um papel essencial não apenas como ferramentas educacionais, mas como avenidas para o desenvolvimento pessoal e profissional”

Rick Menasce, especialista em Ciência e Design de Jogos, e co-fundador da edtech Press Start

Esse é um momento da nossa história em que um antigo paradigma está se encerrando, para dar luz a outra era, centrada no indivíduo, seu bem-estar e sua identidade (D. Shirley, A. Hargreaves., 2022). A escola, nessa transição, tenta se achar e encontrar jeitos de engajar seus alunos de maneiras mais significativas, porém vem encontrando muita dificuldade.

Para isso, a escola precisa olhar mais para seus alunos e suas motivações, e através delas encontrar um modelo que satisfaça tanto às necessidades pedagógicas e educacionais, como ao engajamento e interesse de seus alunos. Mas se pararmos um pouco para observar atentamente, veremos que o jogo é uma das atividades em que as crianças e jovens mais se engajam. 

Hoje, são mais de 3 bilhões de pessoas que jogam no mundo todo, movimentando uma indústria de mais de 200 bilhões de dólares. No Brasil, de acordo com a Pesquisa Game Brasil deste ano, já são quase 75% da população que se considera gamer. Isso acontece pois os jogos satisfazem três necessidades psicológicas básicas: a busca por autonomia, competência e conexão.

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Essas necessidades são explicadas pela Teoria da Autodeterminação, que diz que experiências de autonomia, competência e conexão fomentam à vontade, a motivação e o engajamento, resultando em uma melhor performance, persistência perante um desafio e uma maior criatividade. Ou seja, tudo aquilo pelo qual buscamos em nossos estudantes dia após dia nas salas de aula.

E como os jogos fazem isso? Em primeiro lugar, eles conseguem oferecer ao jogador autonomia de decisão, mesmo que dentro de limites e regras. Nos tornamos autores de nossas próprias vidas, e sentimos que temos controle sobre nossos comportamentos, além de um senso de que nossas ações influenciam diretamente os resultados. Enxergamos nossos resultados quase que instantaneamente através de feedbacks constantes, um dos aspectos de maior relevância presentes nos jogos.

Já com relação à competência, os jogos são criados levando em consideração a progressão de cada jogador, com o nível de dificuldade dos desafios crescendo na medida em que a habilidade da pessoa evolui. Essa relação ideal permite o que chamamos de estado de fluxo, onde perdemos a noção de tempo e há uma imersão completa na atividade em questão. Esse estado é essencial para uma aprendizagem de qualidade e duradoura.

Por fim, os jogos também nos dão a oportunidade de nos conectarmos não apenas com outros jogadores em partidas cooperativas ou competitivas, mas com as histórias, narrativas, mundos e personagens desenvolvidos em profundidade e que dialogam diretamente conosco. Eles nos permitem experimentar o mundo e fazer sentido dele de maneira segura. Nas escolas, os jogos, bem como suas metodologias, deveriam ter um papel essencial não apenas como ferramentas educacionais, mas como avenidas para o desenvolvimento pessoal e profissional.

Por que, então, ao invés de olharmos com atenção e curiosidade para os jogos para aprender com eles, os negligenciamos nos ambientes escolares? Por que tiramos os nossos estudantes de seu universo para trazê-los para um ambiente inóspito, ao invés de gentilmente batermos em suas portas de modo a levar nossas experiências e ensinamentos de maneira que seja relevante a eles, criando assim um ambiente educacional voltado ao indivíduo, seu bem-estar e preservando sua busca por identidade?

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