75 anos do SINEPE/RS: “Juntos, nós poderemos fazer uma educação melhor”
Presidente do Sinepe-RS, Oswaldo Dalpiaz faz uma retrospectiva da atuação da entidade e projeta os desafios do futuro
Grandes transformações sobreviveram no período pós Segunda Guerra Mundial. No Brasil, o processo de industrialização se acelera e, com isso, surgem novas forças sociais no âmbito do trabalho. Para defender os direitos e desejos da classe trabalhadora, o movimento sindical, iniciado no começo do século 20, avança rapidamente. Da mesma forma, as classes patronais se organizaram em associações e sindicatos – como é o caso do Sindicato do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinepe/RS), fundado em 3 de dezembro de 1948.
Em entrevista ao Educação em Pauta, o presidente do Sinepe/RS, Oswaldo Dalpiaz, observa que o perfil do sindicato mudou muito através de seus 75 anos de história, indo além da mediação de questões entre funcionários e donos de escolas.
“Inicialmente, a perspectiva foi ‘sindical’: um grupo de escolas se reúne para conversar sobre problemas que estavam iniciando nas relações entre mantenedoras e seus professores. Na medida em que o sindicato foi se fortalecendo e crescendo, começou a ter novas funções. Chegou um determinado momento em que começou a ter também uma perspectiva pedagógica, a sua razão de ser. Lá pelas tantas, uma perspectiva jurídica, para auxiliar as escolas nessas questões. Então, a ação do sindicato foi se ampliando de acordo com as necessidades”, explica.
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O presidente avalia que a existência de sindicatos do ensino foi decisiva na estruturação de questões pedagógicas que envolvem a educação brasileira. O Sinepe/RS, por exemplo, participou da construção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que define e organiza todo o sistema educacional brasileiro, e da própria Constituição Federal.
“Na Constituição de 1988, a presença dos sindicatos foi fundamental na defesa dos direitos da livre iniciativa da escola privada. E muito do que está escrito lá foi graças à presença e à intervenção dos sindicatos. Na LDB, que saiu em 1996, houve um trabalho muito grande. Eu já participava da vida sindical e sei das viagens que os nossos representantes faziam à Brasília para conversar com os deputados e senadores para que não fosse aprovada determinada redação, mas que fosse aprovada uma outra. Então, o sindicato teve essa preocupação, não só sindical, mas também institucional”, conta.
A manutenção da filantropia nas escolas privadas foi outra luta da qual o Sinepe/RS foi um dos protagonistas. Nos anos 1990, a existência dessa configuração – que isenta as instituições de pagar imposto patronal do Fisco em troca da concessão de bolsas parciais ou integrais – foi ameaçada pelo governo, que iniciou nova regulamentação.
“Houve um trabalho muito grande, muito grande mesmo, e nós conseguimos reverter. Por quê? Conhecemos inúmeras entidades assistenciais. Essas entidades assistenciais se mantêm sozinhas, sem auxílio do governo, a maioria delas. Por exemplo, o Marista mantém uma ou várias entidades assistenciais custeadas pelas mensalidades dos alunos pagantes. Se você for olhar o valor que isso significa, bilhões de reais que o governo deveria desembolsar de uma maneira ou outra para sustentar essas pessoas na escola. Anos atrás, o governo não tinha escolas para todo mundo e quem atendia a população pobre eram as escolas filantrópicas. Então, consideramos uma coisa bonita que, graças a Deus, nós conseguimos manter”, relembra Dalpiaz.
Outra atuação fundamental do Sinepe/RS foi na elaboração dos critérios sanitários que determinaram o retorno às atividades presenciais na pandemia.
“Mobilizamos o Estado. Ajudamos, por exemplo, a interpretar a questão do uso das máscaras, o número de alunos por sala de aula para manter a distância segura, como seria o acesso dos alunos à escola e quantos alunos poderiam ir em cada veículo de transporte escolar. Diversas discussões foram tidas entre nós e a Secretaria da Saúde. Essa é a função do ensino privado. Tivemos posicionamentos muito claros, muito decisivos, e graças a esses posicionamentos começou a funcionar. Se não fosse o sindicato, talvez, as aulas no formato presencial só teriam voltado no início do ano passado”, acredita Dalpiaz.
Outras lutas
Se por um lado, o sindicato tem força vital para contribuir em soluções que impactam a todo o Estado ou mesmo o país, por outro, deve se subordinar à legislação. Oswaldo Dalpiaz lamenta o impasse sobre a adoção do Novo Ensino Médio, modelo para o qual as escolas privadas se prepararam de 2017 a 2022. Nascida sob críticas – especialmente nas escolas públicas –, a reforma, que mudou a matriz curricular e a oferta de disciplinas optativas em todas as escolas do país, foi paralisada para ajustes e seu destino é incerto. Um novo projeto de lei pode sepultar de vez a atual proposta, a despeito dos investimentos em capacitação, laboratórios e recursos humanos feitos pelas escolas privadas para se adaptar à legislação anterior.
A Federação Nacional de Escolas Particulares (Fenep), da qual o Sinepe/RS faz parte, já se manifestou junto a parlamentares do Senado e da Câmara sobre o novo projeto de lei levando alternativas e mesmo sugestões para refinar o modelo.
“Nós, aqui em Porto Alegre, nos reunimos várias vezes para discutir isso e apresentar alternativas. Inclusive, no dia 14 de novembro, reunimos aqui representantes de mais de 100 instituições para discutir o que iríamos propor, o que desejamos e o que as escolas desejam. Se nós tivéssemos o poder de voto, naquele dia quase 100% votaria pela permanência do Novo Ensino Médio com pequenas adaptações e novas interpretações.
Mas esse não é o único desafio enfrentado pelas instituições – e, consequentemente, pelo sindicato. Na opinião de Dalpiaz, hoje e nos anos vindouros uma preocupação central será como atrair os alunos para a sala de aula outra vez.
“Vemos que as instituições de Ensino Superior estão passando por dificuldades enormes em razão da diminuição de matrículas presenciais, influenciada também pelo avanço dos cursos de educação a distância (EAD). Como se manter com poucos alunos presenciais? É um problema seríssimo. O professor precisa ser bem pago, faculdades e universidades têm que oferecer infraestrutura e laboratórios. Mas se não tem aluno que pague seu professor e a estrutura para o atendimento, onde a faculdade vai buscar os recursos necessários? Como uma faculdade presencial vai sobreviver quando um aluno, um jovem, tem possibilidade de fazer um curso online por um terço, um quarto, um quinto do valor da mensalidad?”, questiona.
O presidente do Sinepe/-RS acrescenta que o avanço da EAD se somou à pandemia para dificultar ainda mais o cenário do ensino presencial.
Segundo Dalpiaz, a Educação Básica também apresenta queda nas matrículas.
“Anos atrás, tínhamos aqui em Porto Alegre várias escolas com mais de 4 mil alunos. Hoje, a que tem mais alunos possui 3,2 mil. Embora haja esta diminuição, há um certo grau de otimismo, pois as instituições estão conseguindo estabilizar o número de alunos nos últimos anos. Viajei pelo interior no mês de outubro, e ouvi de muitas escolas o relato de que iam aumentar o número de alunos. Mas esse aumento é muito pequeno. Quando uma escola diz que vai aumentar 5%, mas tem 700,irá aumentar 35 alunos. Já é muito? É muitíssimo, considerando que muitas cidades gaúchas têm hoje uma população menor do que há 10 anos. A longo prazo, não tem como aumentar o número de alunos. Não se tem o mesmo volume de crianças. Isso vai repercutir na escola privada no futuro”, projeta.
Segundo Dalpiaz, criatividade e planejamento são a resposta para o futuro da educação privada. E para alcançá-la é preciso vencer três desafios.
“O primeiro é a escola buscar novas formas de gestão, tanto sob o aspecto econômico-financeiro, quanto no aspecto pedagógico. A gestão pedagógica tem que ser muito dinâmica daqui para frente. A escola não pode se acomodar e permanecer como há 20 anos quando tínhamos um mundo mais lento e as mudanças ocorriam devagar. Deve ser uma preocupação constante para o gestor pedagógico buscar novas metodologias, novas formas de ensinar, nova organização e novas atividades de interação”, opina.
O segundo desafio, diz o professor, é a escola incorporar o mundo digital nas suas atividades pedagógicas. Internet, redes e inteligência artificial precisam estar a serviço da aprendizagem. Já o terceiro desafio é “mais político”, nas palavras de Dalpiaz:
“É político, mas também institucional. Cada governo que assume quer descobrir a roda. Dificilmente um governo melhora o que o governo anterior fez. Então, se continuar assim, a escola deverá sempre estar aberta e ser muito cuidadosa em relação à política educacional de governo. Veja, as escolas de Ensino Médio se prepararam, implantaram um novo modelo em 2022 e antes de o ciclo escolar terminar, mudou tudo. Não há aquela segurança necessária para planejar”.
O futuro do Sinepe/RS
Seja qual for a crise que as instituições privadas de ensino tenham que encarar, uma certeza é imutável: ao lado delas estará o SINEPE/RS, assim como foi desde o princípio. E no entendimento de Oswaldo Dalpiaz, a construção de boas relações com outras entidades do setor educacional, como a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme) e a Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), deve fortalecer ainda mais o sindicato, que ampliará a interlocução com o setor educacional.
“Juntos, nós poderemos fazer uma educação melhor”, acredita o presidente.
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