“A escola não pode substituir a família, mas pode ser uma grande parceira”, diz Isabel Parolin

Psicopedagoga Isabel Parolin destaca a importância do acolhimento em um ambiente escolar, tanto para gestores, professores, alunos e, principalmente, familiares

por: Eduardo Wolff | eduardo@padrinhoconteudo.com
imagem: Divulgação/Flickr

A pandemia criou vários obstáculos, porém trouxe grandes aprendizados e  uma maior valorização em relação ao trabalho desempenhado pelos professores e às necessidades de melhor acolhimento em todos envolvidos no ambiente escolar: alunos, mestres, famílias e gestores. Educação em Pauta entrevistou a psicopedagoga Isabel Parolin, profissional com grande experiência na área de educação, com ênfase em Psicopedagogia e atuação em aprendizagem, escola, família e limites. 

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Educação em Pauta – O acolhimento escolar: o que é e como funciona?

Isabel Parolin – A origem do acolhimento vem de receber, hospedar ou agasalhar alguém, no entanto é um ato episódico, é como dar um “oi”. Se você pensar assim, todo mundo acolhe. Agora, existe um conceito de acolhimento mais elaborado, que se refere em uma outra seara, a ser realizado no plano escolar. Eu costumo dizer que o acolhimento e o cuidado são primas-irmãs, porque se colocam a serviço do outro e promovem respostas adequadas às necessidades de quem está precisando.

Um conceito do Leonardo Boff (teólogo), que eu adoro, é de que cuidar é mais que um ato ou uma atitude, representa um momento de zelo ou deszelo, ou seja, não é episódico. É uma atitude de ocupação, preocupação, responsabilidade e envolvimento afetivo com o outro.

É se colocar na escuta para ter disponibilidade para acolher o outro, é uma hospedagem. Hospedar é trazer ao meu campo, o que tem a oferecer, mas de acordo com a necessidade da pessoa.

O que os gestores devem fazer para acolher os professores?

É entender o que o professor precisa. Um exemplo são os docentes que passaram, praticamente, dois anos em casa, mas sempre em uma situação temporária. Não sabiam quando iam voltar, uma nova cepa pode afetar tudo, enfim, várias situações. É verificar quais são as suas necessidades. São seres humanos e, em alguns casos, houve perdas de pessoas próximas, bem como tiveram que se adaptar ao ensino on-line. 

Os gestores precisam oportunizar um espaço na escola para que os professores falem das suas perdas, dos seus medos. Sei de muitos casos de docentes que realizaram aulas com filhos no colo ou uma situação muito difícil. Também houve momentos em que faleceram parentes e amigos dos professores e a diretoria da escola não sabia. Ter esse espaço de acolhimento permite que isso seja transmitido aos alunos. Esse é o conceito de acolhimento, trazer respostas adequadas e eficientes. É trabalhar dimensões sensíveis e espirituais. 

Essa atividade de conversa com o professor não pode ser episódica, somente na semana pedagógica. É importante que aconteça durante o ano, dar a oportunidade de eles contarem como estão, se estão dando conta ou não em seus trabalhos. Acredito que a direção tem esse papel de cuidar, produzir e ter esse zelo.

Recentemente, acabei de atender a um professor que perdeu o pai e a mãe durante a pandemia. Ele morava em Salvador e se mudou para Curitiba, cidades bem diferentes. Como acolher alguém que está muito triste? A escuta é um processo de humanização. 

Como o professor faz essa transferência de acolhimento aos alunos?

Antes de tudo, é reconhecer o protagonismo do aluno. Eu só consigo reconhecer se já fui protagonista de angústias e emoções. É a busca desses espaços de protagonismo do aluno, desde que eu traga esse acolhimento para mim. Saber partilhar, descobrir o que estão guardando. Desta maneira, suscita emoção.

O acolhimento é como uma categoria no planejamento. E como fazer? É uma cadeia: a conversa entre a direção e professores e, posteriormente, docentes e alunos, como também com os seus familiares. É criar um vínculo de reciprocidade, de confiança. 

Como formas de acolhimento, as escolas realizam rodas de conversa com as crianças, é um momento para contar o que estão sentindo. Esse momento de acolhimento pode ser não verbal, se expressar por desenho, trabalho plástico, escolher uma miniatura que se parece como se sente atualmente. Caso sejam mais tímidos, eu costumo usar uma caixa de bonequinhos e as crianças se comunicam por meio deles, é usar um elemento intermediário. Existem diversas técnicas, o importante é ter intencionalidade. Vão gerar um plano e produzir acolhimento afetivo, escuta e atenção qualificada. Assim, é possível perceber o que a criança está sentindo, porque a aprendizagem só é possível em uma temperatura e tons adequados. Mesmo caso dos professores, se não estiverem bem por algum motivo, não vão produzir corretamente. Isso é muito importante, é a base curricular, a própria Unesco prevê isso. 

O espaço de escuta se dá em conversa. É um momento bacana na escola e é preciso que aconteça em um campo relaxado e prazeroso.

Confira o podcast Caminhos da Educação com Isabel Parolin

E as famílias, são importantes nesse envolvimento de acolhida?

Mais que possível, é necessário estarem presentes. Com a pandemia, podemos classificar vários tipos de famílias. Tiveram aquelas que estavam rezando para voltar ao que era antes. Até março de 2020, os pais faziam uma transferência brutal para a escola. Se queixavam aos professores e não entendiam os porquês que seus filhos não comiam verduras, não faziam a lição de casa ou não largavam o videogame.  

Tiveram aqueles que assumiram a escola em casa de forma inadequada. Ocorreu um caso de uma mãe, que é médica, que dizia que tinha que sair do seu consultório para ir casa e fazer a prova on-line com a filha. Pais que assumiram muitas funções, como postar no Moodle, foi algo inadequado. Esses alunos vão ter dificuldades mais na frente. Houve aqueles que assistiam, opinaram e controlavam as aulas. Foram, de certa forma, situações engraçadas. 

Outro grupo de pais ficaram devendo, não fizeram a sua parte. Claro que não era ensinar, mas sim construir um espaço para a criança ter suas aulas em casa. Também teve familiares que reconheceram o professor como um profissional intelectual, dizendo: “eu não sei ensinar!”

Enfim, poderia relatar vários perfis, mas esses são os principais. Muitos acabaram entendendo que a escola é um espaço de relação e que entregou conteúdo em casa. Nos resta saber o que o filho realmente aprendeu. Isso é uma constatação, a família entendeu, de fato, o papel da escola. O que é ser professor. 

Para ter essa relação com a família, o professor pode fazer de forma presencial ou até uma relação de trocas interativas, para que as conversas não se percam. Aliás, os encontros on-line costumam ter uma grande adesão. É preciso acolher as famílias, ter a atenção adequada. A família tem que se sentir acolhida. A escola não pode substituir a família, mas pode ser uma grande parceira dela. 

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