Como proteger crianças e adolescentes dos perigos do mundo digital

Alessandra Borelli, advogada especialista em conscientização virtual, explica ameaças e dá dicas de como evitar problemas envolvendo crianças e adolescentes

por: Homero Pivotto Jr. | homero@padrinhoconteudo.com
imagem: Freepik

O ambiente virtual pode ser tanto atrativo quanto perigoso. Principalmente para crianças e jovens, já que ainda estão em processo de formação cívica e moral. A pouca vivência decorrente da idade tenra é, em alguns casos, porta de acesso para conteúdo inadequado, desinformação, ação de predadores virtuais e cyberbullying. Para evitar esses e outros problemas, família e educadores precisam estar atentos.

Monitorar a presença online dos mais novos e manter conversas francas sobre os riscos das interações via internet (seja em games, nas redes sociais ou navegando) são dicas para evitar possíveis transtornos. Dentro desse escopo, a conscientização digital de usuários jovens, pais e educadores se mostra necessária. Inclusive, o trabalho da família e da escola, além de essenciais, é complementar.

Para auxiliar os entes envolvidos na árdua tarefa de educar para o uso adequado de novas tecnologias da informação e comunicação (NTICs), existem iniciativas e profissionais dedicados. Alessandra Borelli, sócia do Opice Blum Advogados, é um bom exemplo. A head da área de Educação e Capacitação em Ética, Direito Digital e Proteção de Dados e autora do livro “Crianças e Adolescentes no Mundo Digital – orientações essenciais” (Ed. Autêntica, 2022) desenvolve pesquisas sobre o tema há cerca de 15 anos.

Na entrevista a seguir, ele traz orientações, reflete sobre ameaças e o que podemos fazer para estimular o debate sobre o assunto.

Educação em Pauta – Você é sócia e diretora executiva da Opice Blum Academy, que se dedica à conscientização digital para ajudar educadores, crianças e adolescentes a fazerem o uso adequado de novas tecnologias da informação e comunicação (NTICs). O que envolve a consciência digital para jovens e crianças atualmente?

Alessandra Borelli – A conscientização digital está relacionada com ensinar sobre segurança online, comportamento responsável nas interações digitais, habilidades de pesquisa e avaliação de informações, equilíbrio digital, cidadania online e participação ativa na sociedade digital. Apesar de muito habilidosos, dada a natural condição de ser em desenvolvimento, crianças e adolescentes precisam ser direcionados para que o uso das novas tecnologias se dê de forma segura, ética, saudável e responsável.

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Educação em Pauta – Que tipos de iniciativa a Opice Blum Academy oferece para ajudar os entes envolvidos no processo de inserção de crianças e jovens no mundo online, seja jogos, navegação ou redes sociais? 

Alessandra Borelli – Por meio de palestras, materiais de apoio, dinâmicas, cartilhas, workshops etc, transmitimos de forma didática e objetiva informações e orientações a pais, educadores e alunos (divididos por faixa etária). Abordamos os mais diversos assuntos, sempre levando em consideração as necessidades específicas de cada instituição e o respectivo público, dentre os quais podemos destacar: liberdade de expressão x violação do direito alheio, os riscos da demasiada exposição na web, bullying e cyberbullying, as atitudes de hoje na web e as consequências na vida pessoal e profissional amanhã, responsabilidade legal das famílias e escolas na educação digital de crianças e adolescentes etc.

Geralmente, os alunos são divididos por faixa etária, uma vez que para cada idade existe um desafio e uma vulnerabilidade diferente na web. Nesse formato, ganha-se a oportunidade de maior aprofundamento nos respectivos desafios e oportunidades que as NTICs oferecem.

Educação em Pauta – Quais considera os principais perigos do fluxo constante de informações a que pessoas mais jovens são expostas?

Alessandra Borelli – Entre os principais temos: 

  • Conteúdo inadequado: os jovens podem ser expostos a conteúdos inapropriados, como violência, pornografia, discurso de ódio e incitação ao bullying, o que pode afetar negativamente seu desenvolvimento emocional, psicológico e comportamental.
  • Cyberbullying: o ambiente digital é terreno fértil para a prática do cyberbullying, em que os jovens podem ser alvos de intimidação, difamação e assédio por meio de mensagens, comentários ou publicações nas redes sociais e chats de games.
  • Exposição a predadores online: a interação com desconhecidos pode expor os jovens a riscos de predadores sexuais ou criminosos que se aproveitam de sua ingenuidade e vulnerabilidade.
  • Vício/dependência digital: o acesso constante e excessivo às NTICs pode levar ao vício, resultando em problemas de saúde física e mental, isolamento social, dificuldades de concentração, socialização e desempenho acadêmico prejudicado.
  • Desinformação e fake news: a facilidade de disseminação de informações na internet também traz o risco da desinformação e das fake news, o que tem levado muitos jovens à uma visão distorcida da realidade e à tomada de decisões equivocadas. 
  • Privacidade e segurança: o compartilhamento imprudente de informações pessoais nas redes sociais ou em outras plataformas online tem os deixado ainda mais suscetíveis a fraudes e cyberstalking.

Educação em Pauta – Quais dicas básicas poderiam dar a pais que querem educar digitalmente seus filhos para que usufruam positivamente das possibilidades online?

  • Estabeleça regras e limites para o uso da tecnologia;
  • Tenha conversas abertas sobre segurança online e comportamento adequado;
  • Monitore a atividade online dos seus filhos;
  • Ensine sobre segurança na internet;
  • Incentive o pensamento crítico e a verificação de informações;
  • Seja um modelo digital positivo;
  • Explore o mundo digital junto com seus filhos;
  • Promova o equilíbrio entre o tempo online e offline;
  • A educação digital é um processo contínuo, então esteja sempre atualizado e disponível para apoiar seus filhos.

Educação em Pauta – É possível dizer que há idade mínima para que crianças comecem a usar ferramentas digitais? E sobre o uso de redes sociais, há alguma indicação etária mínima?

Alessandra Borelli – Sim. Celular não é brinquedo e o ambiente digital está longe de ser um lugar seguro para crianças. Quanto às redes sociais, os termos de uso estabelecem uma idade mínima recomendável, porém, costumo dizer que se a criança não demonstrar a mínima maturidade necessária, ainda que tenha alcançado a classificação indicativa, melhor postergar. Conteúdo digital não tem devolução!!

Educação em Pauta – É possível separar o papel da família e o da escola na educação digital de crianças e jovens? Por quê?

Alessandra Borelli – Nunca foi tão necessário famílias e escolas falarem a “mesma língua” e unirem esforços pela educação (inclusive digital) de crianças e adolescentes. Claro que cada um tem o seu papel, inclusive sob a perspectiva legal. Há muito o que se falar a respeito, mas um dos pontos essenciais para o qual chamo especial atenção é sobre a importância das famílias endossarem as regras estabelecidas pela escola no que se refere ao uso das novas tecnologias, e não questionem as medidas disciplinares adotadas quando violadas as regras por seus filhos. Hoje é a escola, amanhã pode ser a justiça.

Educação em Pauta – Falamos de uma questão complexa, com diversas nuances e que demandam uma série de cuidados. O que diria que é recomendado evitar quando se trata da educação digital de crianças e jovens? 

Alessandra Borelli – O mal exemplo é sem dúvida um dos principais cuidados. Para além disso, é importante não subestimar as queixas e mudanças repentinas de comportamento de crianças e adolescentes, que “podem” indicar problemas no ambiente digital, tais como assédio, ameaças ou outro tipo de violência.

Educação em Pauta – Por meio do trabalho que desenvolve, como percebe a aceitação de crianças, jovens, pais e educadores no processo de conscientização digital? Há mais disposição ou desinteresse?

Alessandra Borelli – Vejo mais disposição do que interesse, sobretudo pela abordagem que adoto e metodologia customizada a cada perfil de público.

Educação em Pauta – Você escreveu o livro “Crianças e adolescentes no mundo digital: Orientações essenciais para o uso seguro e consciente das novas tecnologias”. Como foi o processo de pesquisa e confecção da obra? Quais alegrias e agruras de navegar por um assunto tão complexo?

Alessandra Borelli – Para além do cuidado em somente fazer constar pesquisas recentes e de fontes confiáveis e primárias, a obra contempla uma trajetória de quase 15 anos trabalhando com o tema, com casos reais, dicas e orientações efetivamente aplicáveis e experiências pessoais de uma mãe e também educadora que vive os mesmos desafios e angústias do público a que se destina.

Educação em Pauta – Houve cuidados para que a narrativa conversasse com os públicos distintos a que se dedica (crianças, jovens, pais e educadores)?

Alessandra Borelli – Sem dúvida. Tal qual a linguagem e cuidado que tenho ao me expressar e abordar temas, por vezes essencialmente jurídicos, durante minhas palestras, tive com o livro. Considero estar sempre falando com um público leigo e carente de informações assertivas sobre o tema, mesmo sabendo que posso ter um ouvinte ou leitor colega de profissão do outro lado.

Educação em Pauta – Como podemos, todos nós, estimular o debate sobre o tema na sociedade brasileira e fomentar o cuidado com o que ocorre na rotina virtual dos mais jovens?

  • Sensibilizando e conscientizando sobre os desafios e benefícios da educação digital;
  • Estabelecendo parcerias e colaborações com escolas, ONGs e instituições governamentais;
  • Capacitando educadores para abordar adequadamente a educação digital;
  • Envolvendo os pais por meio de workshops e materiais informativos;
  • Promovendo a inclusão digital, garantindo acesso igualitário às tecnologias;
  • Apoiando a criação de políticas públicas voltadas para a educação digital nas escolas;
  • Compartilhando boas práticas em fóruns e plataformas online;
  • Estimulando a pesquisa acadêmica sobre educação digital.

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