Como as instituições de Ensino Superior definiram a volta às salas de aulas

Confira os fatores que pesaram na decisão das IES gaúchas ouvidas pela reportagem para a retomada do ensino presencial no primeiro semestre de 2022

por: Tatiana Py Dutra | tatianapydutra@padrinhoconteudo.com

Este ano, a humanidade completa dois anos de convivência com a Covid-19 mas, no campo educacional, há quem sinta que se passaram décadas. Em 2020, a pandemia obrigou as instituições educacionais a implantarem uma modalidade de ensino remoto com uma velocidade jamais pretendida. No ano passado, o avanço da vacinação aumentou a pressão pela volta das atividades presenciais, mas foi preciso criar alternativas para estudantes e famílias que optassem/precisassem manter o distanciamento. Instalava-se o ensino híbrido.

Tudo isso demandou investimento e esforço de escolas e universidades, bem como de seus quadros funcionais. Mas em 2022, sob auspício do Ministério da Educação, as instituições de Ensino Superior deverão exercer sua autonomia para definir a modalidade educacional a ser adotada. Em um cenário em que 74,9% (dado atualizado até o dia 23/03) da população brasileira já recebeu duas doses da vacina, grande parte das universidades privadas gaúchas optou por voltar às atividades presenciais. Entre elas, a Uniritter, de Porto Alegre, a Universidade Franciscana (UFN), de Santa Maria, o Setrem, de Três de Maio, o Instituto Ivoti, de Ivoti, o Centro Universitário Uniftec, de Caxias do Sul, e a Faculdade Horizontina (FaHor), de Horizontina.

Ainda em fevereiro, a reitoria da UFN já tinha posição definida, conforme nota: “Caso persista a dificuldade de esta modalidade (presencial) ser cumprida integralmente devido à pandemia, a opção será pelo modo semipresencial. Considera-se a prioridade por essas opções uma urgência, devido ao longo tempo transcorrido em distanciamento social.”


Uma lista de motivos

O fator econômico pesou na decisão de retornar à sala de aula, já que o distanciamento e o ensino on-line desmotivaram muitos estudantes, ampliando os cancelamentos de matrículas, e reduziram a ambição de ingresso de novos alunos. No ano passado, a pesquisa “Observatório da Educação Superior: análise dos desafios para 2021” – promovida pela consultoria Educa Insights em parceria com a Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes) – estimou em apenas 25% a intenção de participantes do Enem em começar uma graduação imediatamente.

Já o ensino híbrido, ainda que muito elogiado, é uma possibilidade distante para faculdades de pequeno e médio porte. No Setrem, em Três de Maio, a modalidade só será adotada para atender alunos que, porventura, contraiam Covid-19 este ano.

“Temos equipamentos e profissionais disponíveis, mas se oferecermos essa oportunidade a todos os alunos, talvez não consigamos trazer a turma de volta (ao presencial). E com a possível dificuldade em obter testes gratuitos contra a doença, é possível que muitos deixem de vir alegando Covid”, projeta o vice-diretor da faculdade, Mauro Nuske.

No Instituto Ivoti, as aulas presenciais foram retomadas em setembro de 2021 e, conforme a diretora de Ensino Superior, Doris Schaun Gerber, foi difícil “tirar os alunos de casa”.

“Alguns se acostumaram com o conforto das aulas em casa, e houve outros que tiveram dificuldade com a questão do transporte”, diz, referindo-se aos estudantes que dependiam de ônibus fretados para viajar até a instituição e que tinham dificuldade para fazer o deslocamento.

Mas é a importância da presencialidade para os processos de aprendizagem a principal justificativa das instituições para voltar à sala de aula.

“Existem cursos que, por suas especificidades, se ressentem mais da falta da presencialidade. Isso sem contar o fator de socialização e trocas interpessoais que também promovem o desenvolvimento dos alunos em suas carreiras”.

Débora Frizzo, pró-reitora Acadêmica do Centro Universitário Uniftec

“Nossa instituição oferece somente cursos de licenciatura. Esse contato entre alunos e professores faz parte da formação profissional dos futuros docentes”, pontua Dóris Gerber, do Instituto Ivoti.


Preparativos incluem treinamentos

Em 27 de janeiro, o Conselho Nacional de Educação (CNE) orientou para que as aulas presenciais fossem priorizadas em 2022. O órgão ressalta, porém, a necessidade de adotar medidas preventivas para evitar o contágio por coronavírus, dada a nova onda de casos produzida pela variante ômicron desde o fim do ano passado (veja quadro).

A caxiense Uniftec – que conta com cursos de graduação e pós, presenciais e a distância – preparou treinamentos para o corpo docente e discente.

“Assim como foi feito nestes dois últimos anos, nosso setor de Desenvolvimento Humano e organizacional, via Universidade Corporativa, está atento às adaptações em termos de qualificação e treinamento para acompanhar as mudanças decorrentes da pandemia”, comenta Débora.

Já a Faculdade Horizontina (FaHor) conta com a experiência para garantir um início de semestre seguro, em março. Lá, as aulas presenciais foram retomadas em agosto de 2021 e encerradas com sucesso ao fim do ano, graças ao respeito às medidas sanitárias. A expectativa é que isso se repita em 2022, mesmo sob a ameaça da variante ômicron.

“Conforme temos acompanhado, na Inglaterra, Alemanha, Espanha e Portugal as aulas têm sido mantidas, mesmo com o aumento do número de casos. Aqui, temos um Centro de Operações de Emergências da Saúde (COE) institucional bem ativo, que acompanha semanalmente dados estatísticos de diversos países, do Brasil, do Rio Grande do Sul e da região de atuação, bem como orientações das autoridades sanitárias e decretos estaduais e municipais. Ele gera informações aos órgãos colegiados, que têm optado por manter 100% da presencialidade”, explica o vice-diretor da FaHor, Marcelo Blume.

O professor diz que as práticas da instituição têm sido conservadoras na prevenção e assim devem ser mantidas. Estão garantidos o uso de produtos e procedimentos especiais para limpeza de mesas, cadeiras, pias e torneiras, bem como está mantida a proibição de chimarrão, tererê, comemorações e encontros com alimentação.

“Seguiremos evitando a realização de eventos presenciais que juntem presencialmente turmas e convidados. Na retomada do semestre letivo, o COE retomará orientações sobre a prevenção, em textos e vídeos para estudantes, professores e técnicos”, diz Blume, que qualifica como “exemplar” o comportamento de técnicos, professores e alunos no no uso correto das máscaras, aplicação de álcool em gel e distanciamento.

Nenhuma das instituições consultadas pelo Sinepe exigirá comprovante de vacinação contra o coronavírus para o retorno dos alunos. Em dezembro de 2021, o Ministério da Educação informou que as instituições não poderiam fazer essa cobrança. Porém, em janeiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu essa decisão. Assim, as faculdades estão livres para verificar a vacinação dos alunos.


Aprendizado valorizado

Os recursos investidos na transição do ensino presencial para o remoto não serão desperdiçados com a mudança da modalidade de ensino, tampouco os conhecimentos pedagógicos. Os gestores antecipam que uma série de avanços e aprendizados em termos de metodologias ativas de ensino on-line e híbridas, usadas na pandemia, serão incorporadas ao dia a dia da sala de aula presencial. E esse é apenas um dos ganhos.

“Intensificamos a qualificação docente para o melhor uso de recursos digitais associados às aulas práticas e aulas presenciais, bem como o melhor convívio com câmeras e microfones. Nos procedimentos do Recursos Humanos, houve uma importante mudança em processos e na cultura para a implementação do home-office, tanto na supervisão do trabalho, quanto no controle de horários e ponto”, valoriza Blume, que dirige a FaHor, uma instituição com 500 alunos e 42 professores.

No Instituto Ivoti, a mudança foi além. No ano passado, a instituição fez uma revisão curricular das licenciaturas que permitiu a inclusão de carga horária para atividades não-presenciais na formação dos futuros professores.

“A partir deste primeiro semestre de 2022, nossos alunos terão aulas presenciais às terças, quartas e quintas-feiras, sendo as segundas e sextas-feiras dedicadas à atividades não presenciais. Isso permitirá que gastem menos com o deslocamento, com alimentação e se dediquem aos estudos. Estamos muito felizes de termos os alunos de volta conosco”, diz Doris Gerber.

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