Segurança escolar em foco para evitar novas tragédias
Casos em instituições de ensino aumentam e deixam comunidade escolar em estado de alerta; SINEPE/RS dá dicas para melhorar segurança
Na manhã de 3 de julho de 2025, uma escola municipal de Estação, no Norte do Rio Grande do Sul, viu a rotina ser rompida por uma tragédia. Um adolescente invadiu a instituição com uma faca. Matou uma criança de nove anos, feriu outras três e uma professora que tentou impedir o ataque. Era um dia comum – até deixar de ser.
Casos como esse se tornaram mais frequentes no Brasil nos últimos anos. De 2001 a janeiro de 2025, foram registrados 43 ataques a escolas, com ao menos 47 vítimas fatais, conforme levantamento do Observatório de Direitos Humanos (ObservaDH). E o cenário geral também assusta: segundo o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, em 2013 houve 3,7 mil registros de violência interpessoal nas escolas. Dez anos depois, o número quase quadruplicou: foram 13,1 mil casos em 2023.
Não se trata mais de uma exceção trágica, mas de uma realidade que exige resposta. A pergunta que se impõe, tanto em Estação, em qualquer cidade, em toda escola, é: como evitar a próxima brecha?
O especialista em segurança escolar e consultor de escolas associadas do SINEPE/RS, André Steren, comenta que na rede privada gaúcha a questão já vem ganhando espaço nos debates há alguns anos. Outras começaram a se movimentar este ano, após dois ataques em escolas públicas em Caxias do Sul, na Serra, e Pelotas, no Sul. Entretanto, Steren destaca: nunca é tarde para começar.
“A escola, a partir do momento que entende que segurança é um papel fundamental, ela vai começar a trabalhar internamente para que as coisas comecem a evoluir. Na prática, acontece que a segurança vai ser trabalhada em todas as áreas”, destaca o especialista do SINEPE/RS.
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A primeira mudança clara feita na infraestrutura, segundo Steren, é a alteração no controle de acesso. Ele destaca que, antigamente, as escolas eram todas muito abertas e que hoje já se tem um entendimento da necessidade de adotar procedimentos. Uso de crachá, controle facial, biometria ou acesso com cartão estão entre as práticas mais comuns. Ainda na infraestrutura, há a instalação de alarmes e reforço na iluminação.
“Algumas também investem em uma central de monitoramento, onde câmeras são posicionadas em toda a escola e essas imagens são utilizadas tanto para monitoramento real, como também para monitoramento de registros de ocorrências. Isso facilita muito a vida do diretor para poder tomar uma decisão em cima de algum evento que aconteceu”, acrescenta Steren.
Já com foco na comunidade escolar, treinamentos e palestras são essenciais e cruciais para o sucesso da operação, alerta o especialista. Steren diz que é necessário que os envolvidos entendam o que, de certa forma, estão fiscalizando para que, a partir desses dados, a direção da escola possa pensar em melhores práticas e soluções.
O Ministério da Educação (MEC), hoje, reconhece quatro tipos de violência escolar: agressões extremas – ataques premeditados e letais -, situações de violência interpessoal – hostilidades e discriminação entre alunos e professores, além do bullying -, a violência institucional – que engloba práticas excludentes por parte da escola, quando são desconsideradas diversidades raciais e de gênero. Por fim, o MEC também leva em conta problemas no entorno da instituição de ensino, como tráfico de drogas, assaltos e tiroteios.
Apesar de ser um assunto que deve ser pensado pela escola, o trabalho contra a violência é algo que precisa ser feito em conjunto com o responsável pelo aluno. E também com o próprio estudante:
“Os nossos alunos também procuram saber e perguntar como a escola vai reagir ou o que a escola está fazendo para trazer um ambiente mais tranquilo. Então, os próprios alunos procuram os professores e a direção e perguntam sobre situações de ocorrências que aconteceram e o que foi tomado de decisão”, relata o especialista do SINEPE/RS.
A criação de palestras e treinamentos específicos sobre como evitar o bullying, ter empatia com o próximo, questões de procedimentos de emergência, de evacuação e de resguardo. Ele destaca que esses momentos servem para que as pessoas saibam qual o procedimento correto na hora de alguma ocorrência.
“O pânico, muitas vezes, é criado pela falta de informação. Então, eu acho que o grande segredo é que a informação seja distribuída de forma correta, profissional e que as pessoas entendam que tudo que está sendo feito é para que tenha um ambiente mais seguro, com organização”, opina.
Em seu curso Segurança escolar: técnicas e procedimentos para aumentar a segurança na sua escola, no SINEPE Play, Steren amplia mais essa discussão.
“A questão da segurança nunca foi uma temática que pesou por aqui”, relata a diretora do Colégio Sinodal da Paz, Juliane Prediger. Ela explica que os 55 anos da instituição, localizada em Novo Hamburgo, sempre foram marcados pela tranquilidade, mas que, com o crescimento da cidade, foi necessário adaptar a estrutura (que antes não tinha grades) para incluir controles de acesso e muros de proteção.
“Os portões sempre estavam muito abertos para as famílias entrarem e com o tempo fomos olhar muito forte para essa condição de controle de acesso às portas de entradas. Vimos que era necessário buscar uma orientação técnica e, participando das formações oferecidas pelo SINEPE/RS, chegamos ao nome do André e falamos para ele que estávamos muito preocupados”, conta Juliane.
Para atender a preocupação, a escola, que já estava replanejando o plano diretor, buscou estratégias para o cuidado da segurança das crianças, dos jovens e dos funcionários. Uma das primeiras medidas foi a separação do acesso da comunidade escolar do acesso de pais e terceiros. Além da segurança feita por profissionais da instituição, o Colégio Sinodal da Paz também conta com um serviço terceirizado.
“Dentro de uma semana, em torno de 40% do tempo, eu destino, como gestora, a olhar para a segurança, trânsito e fluxo veicular. É uma demanda que corresponde a uma importância gigantesca dentro de demandas de gestão”, relata.
Outro cuidado é que o núcleo de concentração dos alunos não tenha proximidade com o pórtico de entrada da escola. Da parte do processo de aprendizagem, os educadores da instituição estão buscando entender mais sobre como contribuir com a inteligência emocional das crianças e dos jovens. “São transcrições diárias, pequenas, mas que somam e evoluam e a gente vai ensinando aos nossos futuros adultos que a gente pode fazer conforme a cultura de coletividade”, pontua Juliane.
Na Escola Dr. Martinho Lutero, em Canoas, os profissionais que atuam na instituição participam, no final de maio, de uma formação chamada “Prevenir é salvar vidas – técnicas e procedimentos para aumentar a segurança na escola”. O local conta com educadores da equipe pedagógica que se posicionam, diariamente, no mesmo local para fiscalizar o trânsito de pessoas em entradas e saídas.
A coordenadora pedagógica da escola, Liliane Santos, conta que a instituição conta também com apoio da Brigada Militar, da Guarda Municipal e de uma empresa de segurança para caráter preventivo e em caso de emergência. Além disso, conta com a ajuda do SINEPE/RS, por meio do especialista em segurança, para aprimorar o processo.
“Fundamentamos em protocolos emergenciais, temos definido aqui. Quando acontece uma situação, eu vou ligar para tal pessoa, fulano vai acionar o botão tal. Todo mundo sabe o que tem que fazer, senão fica todo mundo fazendo a mesma coisa e ninguém faz nada”, analisa Liliane.
Agora, o próximo passo é trabalhar a temática com os alunos. A ideia é, por meio de simulações, treinar os estudantes para casos em que o recomendado seja permanecer na sala de aula, ao invés de fugir – como é o recomendado em casos de incêndio.
“Eu sei que parece pessimista falar isso, mas a gente precisa capacitá-los. Em caso de um ataque, o que a gente faz? Vai cada um agir de uma forma? Não! Vai todo mundo se proteger”, complementa.
E Liliane ainda deixa um recado: “Existem situações que não tem como evitar, mas outras sim. Todas essas que sabemos é preciso cuidado redobrado”.
No início deste ano, o Ministério da Educação (MEC) criou o Núcleo de Resposta e Reconstrução da Comunidade Escolar (NRRCE). O trabalho do grupo é oferecer suporte psicossocial e desenvolver ações de prevenção, respostas imediatas e estratégias de reconstrução para comunidades escolares afetadas por episódios de violência extrema. Apesar de não atuar diretamente com a rede privada de ensino, é um bom guia de informações e medidas.
O NRRCE está vinculado à Coordenação-Geral de Acompanhamento e Combate à Violência nas Escolas, da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi). Sua atuação se alinha às diretrizes do Sistema Nacional de Acompanhamento e Combate à Violência nas Escolas (Snave).
Além da produção de guias e cartilhas com orientações a governos e escolas, o MEC tem formado profissionais por meio do curso Atuação na Resposta e Reconstrução da Comunidade Escolas após Ataque de Violência Extrema, disponível no Ambiente Virtual de Aprendizagem do Ministério da Educação (Avamec). Entre os conteúdos estão primeiros socorros psicológicos, manejo do luto e reabertura das escolas após ataques, fortalecendo as capacidades locais para uma resposta eficaz e estruturada.
O Núcleo é focado em três frentes:
O governo federal também tem um programa, o Escola que Protege, que promove a formação continuada de profissionais da educação. Esse fomenta a construção de planos de enfrentamento à violência e respostas a emergências e também assessora as redes de ensino em casos de ataques de violência extrema.
O programa oferece formações temáticas para os profissionais da educação, além de promover a cultura de paz e a convivência democrática. A adesão é voluntária, mediante assinatura de termo de compromisso.
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