A escola que construiu seu próprio planetário

Madre Imilda, de Caxias do Sul, incluiu o espaço interativo em seu projeto pedagógico, despertando interesse de alunos e familiares; Coordenador pedagógico defende que gestores não pensem que tudo é impossível

por: Pedro Pereira | pedro@padrinhoconteudo.com
imagem: FreePik

Os estudantes brasileiros despertaram para a Ciência, agora cabe às instituições nutrir esse desejo de aprender para que o país conte com novos pesquisadores nas próximas décadas. Levantamento conduzido pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPTC), em 2019, mostrou que quase 70% dos jovens têm interesse em Ciência e Tecnologia. Foram entrevistados 2,2 mil pessoas, entre 15 e 24 anos, em 21 estados e no Distrito Federal. 

O interesse pelo tema ficou à frente, inclusive, de assuntos como esportes (62%) e religião (67%), perdendo apenas para meio ambiente (80%) e medicina e saúde (74%). Os líderes da lista estão ligados à ciência, ainda que não necessariamente à pesquisa científica. E tendem a estar cada vez mais ligados, também, à tecnologia, em uma convergência natural.

Para atender a esse público, inovar e despertar o interesse em mais alunos, o Colégio Madre Imilda, de Caxias do Sul, pensou em uma solução diferenciada: um planetário. O aniversário da instituição, em março, foi comemorado com a inauguração do espaço, mostrando aos 1,3 mil alunos que os 95 anos da escola não a engessaram – muito pelo contrário. 

Desde a inauguração, o planetário é uma das maiores atrações do colégio. “O desafio maior foi, primeiramente, desconstruir na mente da nossa equipe que isso era uma coisa impossível, a ideia de que não era para nós. Vamos primeiro estudar, ver como é, se é viável. Quando começamos com a ideia, pensamos em fazer tudo sozinhos. Em seguida, resolvemos descolonizar a mente, pensando em algo mais sofisticado, e resolvemos ver o que tinha no mercado”, lembra o coordenador pedagógico da instituição, Toni Olsen.

A ideia do planetário veio como consequência de um projeto maior, intitulado Elo, que começou em 2022. Esse conjunto de medidas tem como objetivo a conquista de resultados acadêmicos, fidelização de alunos e a qualificação acadêmica da escola – tanto do corpo docente, quanto dos resultados dos estudantes durante a passagem pela instituição como dos egressos. As ações envolvem alunos, professores e comunidade em geral.

O novo espaço tornou-se um dos principais pontos. Um lugar para que os alunos tenham experiência sensorial, oferecendo uma vivência plena para a construção de conhecimento. “Esta é uma área bastante sensível e estratégica hoje, a questão da astronomia, da ciência. Como a gente não queria daqueles modelos infláveis, mas sim uma estrutura um pouco mais robusta, para dar conta de uma demanda maior, termos mais experiências, se buscou conhecer as viabilizações técnicas e se fez isso dentro do planejamento estratégico”, conta Olsen.

Planejamento estratégico

O projeto Elo, por sua vez, também está sob um guarda-chuva: o do planejamento estratégico que o colégio implementa desde 2015. Fazer com que o aluno tenha experiências significativas dentro da escola é um dos aspectos pedagógicos mais importantes do documento. O objetivo é montar um percurso de vivências para que ele construa conceitos e percepções, congregando tudo para a construção do conhecimento.

Segundo Toni Olsen, a equipe está preocupada em oferecer uma escola que tenha significado e faça diferença, um polo irradiador de cultura para a comunidade, não ficando presa aos processos internos. Várias experiências estão sendo formatadas neste sentido. Os pais, por exemplo, montam grupos para participar de sessões no planetário.

Desenvolvimento

Depois de descobrir empresas especializadas em montar planetários, optou-se por uma do Paraná, que cuidou de todo o projeto, desde o começo. O prédio do colégio tem uma área com pé-direito bastante alto – o que levou algumas salas a terem rebaixamento. A saída foi simples: pegar uma dessas salas, retirar o rebaixamento e aproveitar o espaço por inteiro.

Algumas adaptações foram necessárias, como pintura, fechamento das aberturas, iluminação especial, elétrica e sonorização – que ainda aguarda a chegada de mais equipamentos, de última geração. “Tudo foi construído de acordo com as dimensões da nossa sala, depois transportado.É enorme, a cúpula, mas tínhamos espaço arquitetônico que possibilitava”, detalha Olsen. Além dos equipamentos fabricados especialmente para o projeto, outros vieram do Exterior.

A personalização do projeto não é exclusividade do fornecedor escolhido pelo Madre Imilda. Na pesquisa, os gestores do colégio encontraram laboratórios universitários que também montam esse tipo de espaço, além de outras empresas. Tudo pode ser customizado de acordo com o espaço, o público e a necessidade.

Passada a primeira rodada, para todos os alunos conhecerem o espaço, ele agora está na fase de implementação curricular. Aos poucos, o planetário vai entrando na rotina de mais professores, alinhado com os projetos das turmas, que vão para a atividade com fins acadêmicos.

Com capacidade para cerca de 30 alunos, o domo tem 5,3 metros de diâmetro e pé-direito alto. As turmas são levadas, uma a uma, para atividades de assuntos como física, geografia e biologia. A operação é acompanhada de perto por um professor de Física e outro que tem formação em Oceanografia – uma das possibilidades é analisar o fundo do mar em uma experiência imersiva.

Receptividade

Não é toda hora que se vê um planetário. As famílias receberam com bastante curiosidade, querendo saber exatamente o que era. Depois, participar do processo, interagir, conhecer, vivenciar. 

O efeito, segundo o coordenador Toni Olsen, foi muito positivo. “A comunidade vê a escola preocupada em inovar sem perder sua identidade. Hoje é um ponto-chave para qualquer processo de gestão. Existem muitas tendências de inovação, surgem coisas pelos quatro cantos, mas inovar e perder a identidade é um problema muito sério. O desafio não é inovar, mas fazer isso mantendo o carisma e o projeto pedagógico”, sustenta.

Segundo ele, fazer isso passa, primeiro, por ter clareza do projeto educativo, da própria identidade. No caso do Madre Imilda, trata-se de se manter fiel ao projeto educativo da Rede ICM de Educação e Assistência Social, que sempre norteia todos os projetos.

Quem também está adorando a novidade são os alunos. A imersão oferecida coroa uma preocupação com troca de experiências entre eles, com espaços amplos de convivência, alimentação, capela, tudo perto da biblioteca e do novo planetário.

Possibilidades

O planetário tem uma série de utilizações. As experiências imersivas partem, logicamente, da astronomia: visitar galáxias, constelações, ver o céu a partir de um ponto específico da Terra, ver o céu em determinado momento histórico (escolhe uma data e vê como estava o céu naquele dia). Também é possível simular uma ida a Marte, a partir de imagens enviadas pela NASA, a agência espacial norte-americana, assim como outros planetas. O estrelário mostra como era o espaço há milhares de anos, comparando com a formatação atual e, talvez o mais interessante, como será daqui a determinado período. 

Já o oceanário vira um grande aquário, com visualização 360º para observar espécies e suas relações. Em suma, qualquer vídeo pode ser projetado nessa perspectiva, dando dinamismo ao processo de aprendizagem.

Com a licença de Neil Armstrong, primeiro homem a pisar na lua, em 1969, pode-se dizer que este é um pequeno passo para o colégio, mas um grande salto no objetivo de despertar o interesse de mais alunos pela Ciência. “A gente quis buscar um planetário com estrutura profissional para ter aporte científico mais qualificado, mas vem junto com outras ações importantes, como olimpíadas de conhecimento científico, projeto de mostra científica, iniciação científica em geral”, analisa Olsen. 

Ele lembra que, no Novo Ensino Médio, a instituição tem itinerários formativos orientados à iniciação científica e os laboratórios fazem parte disso. “A escola precisa se conformar nesse sentido. Os alunos tinham interesse muito grande por astronomia, geolocalização, geociências, então entendemos que atendia a uma demanda deles. Não adiantaria construir se não trabalhar com o assunto. Estava no foco de atenção da comunidade e vem para somar”, acredita.

Olsen conclui defendendo que o papel da escola é tratar a Ciência com a seriedade que ela exige. Isso significa oferecer espaço e estrutura, o que demanda alto investimento. Aí, o jeito é, como ele diz, descolonizar a mente, analisar e encontrar a viabilidade.

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