Escola e Comunidade: entrecruzando universos

Professora Maura Coradin Pandolfo fala sobre o papel da escola na comunidade

imagem: Freepik

Maura Coradin Pandolfo

Professora de Língua Portuguesa das Unidades Educacionais AVAEC – Veranópolis

“Conectados, somos (co)criadores com o universo”. Essa é a temática que nossa escola – a AVAEC, Unidades Educacionais, de Veranópolis – adotou para nortear suas ações pedagógicas neste ano. Dentre outras reflexões, ela nos leva à compreensão de que nossas ações implicam mudanças no universo, cujo sentido, nesse contexto, transcende a concepção de cosmo: abrange o universo pessoal e o modo como ele reverbera em outros universos: o familiar, o escolar, o comunitário… Da mesma forma, esses espaços também atravessam o ser. Assim, é dever da escola reconhecer sua função dentro da comunidade, pois seu universo não é isolado. Ao contrário, são mundos que se entrecruzam, visto que o aluno carrega, para dentro do ambiente educacional, os valores e a cultura fundamentados no berço social, bem como modifica essa mesma realidade a partir das aprendizagens construídas na escola. E que papel, afinal, é esse? Como educandários e comunidade podem se conectar e serem transformadas por essa conexão?

De início, menciona-se que a escola deve ser promotora de ações sociais. Se, por um lado, é responsabilidade dos órgãos competentes assegurar políticas públicas que atendam às demandas mais básicas de uma comunidade, por outro, esse fato não exime as instituições de ensino de desenvolver projetos solidários, como campanhas de alimentos e de agasalhos. Trata-se de uma oportunidade ímpar de ensinar os alunos a direcionar seus olhares ao próximo, percebendo suas necessidades e, ao mesmo tempo, o potencial que ele próprio, estudante, tem de intervir nessa realidade que não é sua, mas que pode ter suas dores minimizadas por atitudes de compaixão. Não há motivo mais nobre que este: ajudar quem precisa e enxergar nesse ato um meio para estimular a solidariedade e a empatia da criança e do adolescente.

Nesse viés, compartilho projetos de nossa instituição que visam a esses propósitos. Dentre eles, o Tampinhas Solidárias, que desde 2016 arrecada tampinhas plásticas trazidas por alunos e pela comunidade, revende-as e, com o valor arrecadado, adquire cadeiras de rodas para entidades que necessitam. Também, menciono o projeto Literarte: literatura, arte e sabor, o qual consiste na apresentação, por parte dos alunos do Ensino Médio, de uma peça teatral clássica, que ocorre no clube social do município. O evento, que em 2023 realizará sua quarta edição, converte parte do lucro oriundo dos ingressos a entidades de Veranópolis. Essas atitudes, portanto, demonstram a responsabilidade social do educandário, seu desejo de contribuir com melhorias na comunidade e, sobretudo, lega aos estudantes ensinamentos de vida dos quais tanto carecem nossa sociedade atual. 

Compete à escola, ainda, ser espaço de acolhimento e de apoio. Essa demanda se mostrou ainda mais urgente durante a pandemia de Covid-19, quando houve uma cisão dos laços sociais por conta da necessidade de isolamento. Desse cenário, emergiram a ansiedade, o medo, as dificuldades, o luto, dentre outros incontáveis desafios. Ora, se eles perpassam a vida social, é claro que atravessam o universo do aluno e que, consequentemente, afetam a escola. Portanto, cabe a ela acolher esse contexto e ressignificá-lo, projetando esperança, segurança e solidariedade às famílias e à comunidade.

Essa foi, inclusive, nossa preocupação, não só durante os meses em que as escolas estiveram fechadas – nunca inativas –, mas também no retorno dos discentes a esse espaço. Diante dessa conjuntura, algumas propostas foram executadas: o projeto Poemas nas Ruas, por exemplo, disseminou palavras de afeto à comunidade veranense por meio de um carro de som que reproduzia essas mensagens na voz das crianças e de seus familiares. Projetos socioemocionais também compõem a lista: visando ao trabalho com o autoconhecimento e gestão das emoções, criou-se a Hora do Eu junto à Educação Infantil e aos Anos Iniciais, Meus Mundos, Meus Eus e Formação da Personalidade nos Anos Finais e Projeto de Vida no Ensino Médio – atividades que foram reconhecidas no Prêmio Inovação SINEPE/RS 2022, em que a instituição conquistou o Ouro na categoria Gestão Institucional. 

Esses momentos ofertaram espaços à escuta e serviram de direcionamento aos alunos e às suas famílias durante a pandemia. Devido aos exitosos resultados dessas propostas, elas – ao lado de tantas outras – continuam presentes no fazer pedagógico de nossa escola, porque acreditamos no seu potencial de formar cidadãos cada vez mais críticos, criativos e gestores de suas emoções, tendo consciência de que, em breve, eles deixarão o ambiente escolar para atuar e fazer a diferença, de forma mais expressiva, em outros espaços. A escola, todavia, sempre estará presente em suas vidas, por meio dos ensinamentos nela solidificados. Vê-se, então, como é impossível dissociá-la da comunidade: um universo reverbera no outro de forma contínua. 

E quem resgata, documenta e propaga os feitos de uma comunidade? A história daqueles que a desenvolvem? Não deixemos passar em branco também essa responsabilidade da instituição escolar. Os diferentes componentes curriculares permitem acesso à informação sobre os lugares e os fatos considerados mais relevantes: conhecemos tantas histórias do país e do mundo; tantas personalidades que modificaram esses espaços em seus respectivos tempos. E quanto aos que constroem a comunidade? Conhecemos a nossa história? A escola deve mostrar ao estudante suas raízes e ensiná-lo a valorizá-las. Dessa forma, ao encontrarmos personagens admiráveis em uma obra literária, por exemplo, que tal neles nos inspirarmos para pesquisar e registrar a trajetória de vida daqueles que fizeram diferença na comunidade? Assim procedemos, há alguns anos, a partir da leitura do livro Extraordinário, de R.J. Palaccio, que propiciou aos alunos buscarem, no seu entorno, pessoas que se destacaram e que, por isso, foram consideradas por eles extraordinárias para nosso município e região. O resultado das pesquisas foi documentado em vídeo e exibido ao público durante as Mostras Culturais de nossa escola. A longo prazo, constitui-se como documento histórico e cultural desta localidade.

Portanto, fica nítida a necessidade de entrecruzar o universo da escola ao da comunidade, fazendo de uma a rede de apoio da outra, de acolhimento e de valorização. As práticas que foram aqui brevemente compartilhadas a esse respeito sinalizam possibilidades – certamente, adequadas ao tempo e ao contexto em que foram desenvolvidas. Ainda assim, podem ser inspiração e convite à reflexão para executar propostas cada vez mais significativas, capazes de beneficiar a sociedade que circunda a instituição escolar, bem como ser oportunidade para humanizar o estudante. Fato é que, nesse processo de conexão, não há perdas: todos saem vitoriosos. 

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