Rede busca ajudar professores a desenvolver a criatividade em sala de aula
Conceito surgido a partir da educação infantil, aprendizagem criativa colabora para transformações na educação em diferentes níveis
Observar crianças no jardim da infância pode ser uma atividade mais que divertida, mas inspiradora. Foi justamente com uma observação atenta no modo como os pequenos e pequenas desenvolvem novas habilidades que surgiu o conceito de aprendizagem criativa.
A aprendizagem criativa foi proposta por Mitchel Resnick, pesquisador do MIT Media Lab (Massachusetts Institute of Technology), nos Estados Unidos. A ideia central é baseada principalmente no construcionismo de Seymour Papert, também pesquisador do MIT.
Influenciada por pensadores da educação como Piaget, Paulo Freire e Maria Montessori, a aprendizagem criativa tem como norteadores o que chamamos de 4P’s. São eles:
“A aprendizagem criativa é uma abordagem pedagógica proposta pelo grupo de pesquisa Lifelong Kindergarten, do MIT Media Lab, nos Estados Unidos, que se inspira na forma como a aprendizagem acontece no jardim de infância. Na educação infantil, as crianças aprendem motivadas pela curiosidade e interesse, criando projetos, em um ambiente colaborativo e de forma livre para errar, refazer, testar materiais e tecnologias diferentes e refletir sobre o que estão criando. Esses são os 4 P’s da aprendizagem criativa: Paixão, Projetos, Parcerias e Pensar brincando”, contextualiza André Peres, professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) e integrante da Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa (RBAC).
Criada em 2015 por um grupo que engloba educadores, artistas, pais, pesquisadores, empreendedores, alunos e organizações que promovem práticas criativas e processos “mão na massa”, a RBAC possui núcleos regionais que atuam diretamente com as comunidades escolares e também em parceria com empresas e outras instituições de ensino. No Rio Grande do Sul, o Núcleo Porto Alegre iniciou suas atividades em 2018 e é sediado dentro do POALab, no IFRS, em Porto Alegre, e atua em toda a região metropolitana. A iniciativa para a capital ter o seu próprio núcleo da RBAC partiu de Peres, que buscava uma alternativa para renovar os processos de aprendizagem no IFRS.
“Em 2015, eu criei o POALab e, logo em seguida, em 2016, teve início a primeira turma do Mestrado Profissional em Informática na Educação. Nessa época, eu estava estudando como alinhar um espaço mão na massa com tecnologias digitais e a criação de experiências de aprendizagem. Comecei a estudar os trabalhos de Seymour Papert, Gary Stager, David Cavallo, Paulo Blikstein e Mitchel Resnick. Foi quando conheci a RBAC e, a partir da participação nas reuniões do Núcleo de Pelotas, fui inspirado para criar o de Porto Alegre”, lembra Peres.
O núcleo serve como referência e apoio para professores, alunos e quem mais estiver interessado na adoção da aprendizagem criativa. Peres explica que esse apoio é realizado por meio de encontros, eventos, capacitações e, principalmente, troca de experiências.
“É um espaço de construção de conhecimento que acontece de forma coletiva. Dá espaço e valoriza as experiências e opiniões de alunos e professores na criação de experiências de aprendizagem alinhadas com a aprendizagem criativa”, explica.
Na última edição do Fórum Econômico Mundial, na cidade de Davos, na Suíça, a aprendizagem criativa ganhou destaque com o anúncio da criação da Education 4.0 Lighthouses (Faróis da Educação 4.0, em tradução livre), uma rede de iniciativas que promovem experiências educacionais inovadoras. Formado por 16 instituições, a ideia é promover e apoiar experiências que estimulem novas formas de aprender e ensinar, elementos que integram a lista de habilidades para o que está sendo chamado de 4ª Revolução Industrial, momento que pede transformações educacionais que coloquem o aluno no centro do processo de aprendizagem. A RBAC ganhou a responsabilidade de representar o Brasil neste espaço de relevância para o tema. Desafiadora desde a sua chegada, a aprendizagem criativa ganha luz após a criação da rede, o que promete uma atenção maior para propostas que coloquem o aluno no centro do processo educativo.
Para que isso ocorra, as tecnologias utilizadas são adequadas à idade: giz de cera, massa de modelar, tinta e materiais não estruturados. Mas quais seriam as tecnologias possíveis para trazer a aprendizagem criativa para a educação básica e superior? Segundo Peres, é esse desafio que move a RBAC.
“Na prática, o professor realiza um projeto com os alunos, refletindo sobre o conhecimento que deseja que eles aprendam e como despertar o interesse no assunto. Ou seja, como conectar o tema à paixão deles. É uma aula de geografia? O aluno pode estudar sobre times de futebol daquele país, ou bandas de rock, ou simular uma viagem pesquisando hotéis, museus e pontos turísticos. Neste projeto, é importante respeitar as diferentes formas de expressão: um grupo pode fazer um vídeo, outro grupo uma música, um texto”, explica o professor.
Uma forma de avaliar a adoção da aprendizagem criativa é por meio do produto final: se cada grupo apresenta algo completamente diferente dos demais e surpreende o professor, a aprendizagem criativa aconteceu. Tecnologias digitais entram no processo com o mesmo intuito da massinha de modelar na educação infantil. Criar algo novo, a partir da pesquisa e do estudo, juntamente com o auxílio dos professores, é o que motiva a abordagem e torna a aprendizagem efetiva.
“Muitos professores já fazem atividades muito alinhadas com a aprendizagem criativa. Às vezes, se sentem isolados em suas escolas, ou gostariam de mudar sua prática. A primeira coisa a fazer é participar de um núcleo da RBAC. As teorias e conceitos estão disponíveis na internet, mas o valor continua nas pessoas. Então, esse é o primeiro movimento a ser feito: se conecte à rede de pessoas”, orienta Peres, que também destaca que o reconhecimento da RBAC e da abordagem da aprendizagem criativa pelo FEM ajuda na construção de uma visão uniforme do que significa essa abordagem, da sua importância e impacto efetivo.
“Além dos núcleos como comunidades de prática, atualmente o programa Escolas Criativas trabalha diretamente com secretarias de educação na adoção sistêmica da aprendizagem criativa em todo Brasil. Esse reconhecimento traz mais força para a adoção da aprendizagem criativa no Brasil através da influência do FEM na construção de políticas públicas. Também serve como reflexão para que não adotemos essa abordagem pedagógica para a criação de apenas trabalhadores criativos, mas de cidadãos criativos, críticos e conscientes de seu papel, conhecimento e capacidades”, conclui.
TAGS
E fique por dentro das novidades