Instituições de ensino começam a realizar aulas no metaverso

Mercado está a todo vapor e instituições buscam preparar professores e profissionais para atuar no segmento

por: Ítalo Cosme | Especial
imagem: Depositphotos

No início deste ano, cerca de quatro mil estudantes participaram de um experimento promovido pelo Centro Universitário FIAP.  Do lugar onde estavam – e não era o acadêmico –, foram separados em grandes grupos de 250 estudantes e colocados em salas distintas. Mas não trata-se de um espaço virtual comum, como Google Meets ou Zoom. Este local é chamado de metaverso: onde o indivíduo é um avatar, cria estruturas, desenvolve soluções, conversa com os pares e assiste palestras. 

As professoras Luciana Backes e Eliane Schlemmer, autoras do artigo “O processo de aprendizagem em metaverso: formação para emancipação digital”, compreendem o metaverso como um meio que materializa a criação de Mundos Virtuais, de modo que os diferentes espaços são representados em 3D, o que proporciona que se criem e inventem mundos paralelos. Pode-se listar diferentes elementos que o caracterizam, entre os principais: a interação, a invenção, a colaboração, a cooperação, a coexistência, a realidade aumentada, a realidade mixada e a inteligência artificial. 

O espaço de realidade virtual, concebido ainda na década de 1980, ganha cada vez mais força entre as instituições do Ensino Superior público e privado no Brasil. Aulas já ocorrem nestes locais, mais pesquisas surgem sobre o tema, e a demanda por profissionais cresce mês após mês. Isso ocorre, principalmente, por dois fatores: o salto tecnológico que a educação deu durante a pandemia e a aposta de Mark Zuckerberg no mundo alternativo.

Diretor de Inovação e Redes de Cooperação do Semesp, Fábio Reis sugere que as instituições busquem e incentivem a utilização do metaverso. Reis salienta a necessidade de não apenas utilizar o espaço de realidade aumentada, mas incorporar projetos pedagógicos, acadêmicos e institucionais para, assim, fazer os investimentos corretos. 

“Nós aprendemos a utilizar de uma forma mais qualificada o mundo virtual e teremos de continuar aperfeiçoando. O metaverso terá de ser estudado pelas instituições. Empresas estão investindo bilhões de dólares nestes locais. São produtos e terrenos vendidos”, comenta. O investimento é intenso especialmente na China, países europeus, EUA e México. 

Vídeo da Meta, empresa que gerencia Facebook, Instagram e WhatsApp, apresenta o metaverso como um lugar em que é possível entrar em seus livros didáticos (Clique para assistir)

Mas é possível, de fato, um processo de ensino-aprendizagem consumar-se neste ambiente? Para o professor Anibal Lopes Guedes, sim. Desde que haja momentos nos quais tanto alunos quanto professores habitem diferentes “mundos virtuais”, de forma que consigam interagir um com o outro, independentemente de tempo e espaço. 

“Só assim, podemos elaborar hipóteses de forma a testá-las e vivenciar experiências de aprendizagem enquanto ‘coensinantes’ e ‘coaprendentes’, citando aqui minha professora Eliane Schlemmer”, reforça o docente da Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus Erechim. 

No entanto, as cifras são altas para ter um “terreno” ou construir algo no metaverso. Para o professor Guedes, o problema é a modelagem do mundo virtual que requer técnicos em computação para auxiliar no desenvolvimento das experiências em 3D. O docente, no entanto, acredita que este é o futuro da educação. 

“Quando pensamos que o metaverso é uma tecnologia que permitirá repensar a ideia de currículo através de experiências mais significativas aos alunos, bem como os professores, isso faz com que repensemos as práticas pedagógicas, além de proporcionar novas possibilidades de aprendizagens.”

Sobre o alto custo, Guedes opina que será momentâneo. “Há plataformas open source, como o OpenSimulator. Teremos de habitar esses espaços de forma a compreender como procedermos a modelagem de mundos virtuais.” 

Entre as instituições que já trabalham nesta perspectiva estão a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), através dos projetos da professora Dra. Eliane Schlemmer; a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), por meio de teses envolvendo o contexto educativo e empresarial, além da Universidade de São Paulo (USP) e da PUCRS, em Porto Alegre

O professor e pesquisador Eduardo Campos Pellanda, do Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da PUCRS, tem testado não apenas as novas tecnologias, mas também tem avançado em discussões mais humanas. 

“Como as pessoas vão lidar e vão usar? Como a tecnologia vai se dá no dia a dia? O que é bacana usar na realidade virtual ou na realidade aumentada, e como isso conversa no metaverso?”, questiona sobre alguns pontos levantados. 

Na pandemia, o docente simulou uma aula junto com alunos do curso de Jornalismo no campus da instituição, dentro do metaverso. “Nós criamos, ainda, dois cursos diferentes para ensinar o que é o metaverso, como funciona e como se dá”. O professor detalha ainda que, durante a simulação, os alunos criaram um aplicativo como guia do campus. 

“A gente conseguiu sair do ambiente de duas dimensões para um de três. Conseguimos ver novos espaços, novas possibilidades. A gente entendeu como fazer juntos um novo tipo de aula. O metaverso permite simular espaços. Um estudante de jornalismo pode entender como se proteger em uma simulação de guerra, como a que ocorre na Ucrânia, por exemplo”, pontua. 

A Universidade de São Paulo e a United States of Mars, USM (formalmente chamada de Radio Caca,RACA)  estão em acordo de cooperação internacional para fomentar pesquisas sobre aplicações e aspectos técnicos, econômicos e legais do Metaverso.

É a primeira vez que a USP recebe um NFT (Non-Fungible Token, ou token não-fungível) por meio de uma parceria. De acordo com o professor da USP, Marcos A. Simplicio Jr., o token em questão refere-se a uma terra rara no metaverso que está sendo construído pela USM em parceria com outras universidades do mundo, o USM Metaverse.

Essencialmente, isso significa que a USP terá suas próprias “terras virtuais”, dentro das quais poderá construir diferentes espaços para interação com e entre usuários (alunos, professores, pesquisadores, visitantes, etc) em um ambiente de realidade virtual, aumentada ou mista. 

Espera-se que este projeto do Metaverso seja útil aos pesquisadores de diferentes áreas, como por exemplo: grupos de pesquisa interessados em modelagem 3D, realidade virtual e aumentada e em ambiente imersivo, onde podem modelar o espaço real da universidade dentro da plataforma virtual. Estudiosos nas áreas de educação e psicologia podem avaliar o aprendizado e o comportamento em aulas e interações realizadas nesse ambiente; pesquisadores da área de tecnologia podem avaliar a eficácia de diferentes dispositivos de realidade virtual/aumentada para acesso ao metaverso; etc.

Os mecanismos internos ao metaverso em questão também podem ser tema de estudo por pesquisadores das áreas de engenharia, economia, direito e comunicação e artes, na tentativa de aprimorar a plataforma como um todo.

Experiências

John Paul Hempel, coordenador acadêmico dos cursos de Engenharia do Centro Universitário FIAP, conta que a experiência na instituição deve se expandir ainda mais, com uso das ferramentas do Microsoft Teams, que tem desenvolvido o próprio metaverso. A expectativa é de que já no próximo ano, um curso completo, especialmente os de EAD, no Ensino Superior seja disponibilizado no metaverso. 

De acordo com o docente, no experimento com mais de 4 mil alunos, não se sabe onde esses estudantes estavam justamente por eles poderem entrar de qualquer lugar. Alguns utilizaram óculos de realidade virtual, para ter experiência mais imersiva, enquanto outros não. 

“Nós fizemos uma palestra, onde explicamos os principais conceitos do metaverso. Depois, dividimos as turmas e lançamos desafios para elas construírem soluções para a educação a partir do espaço onde estavam inseridos. Depois disso, os participantes apresentaram as propostas à turma e para o professor. Os melhores foram premiados.”

Hempel frisa que ainda não há curso completamente ofertado dentro do metaverso, mas há disciplinas que utilizam do espaço para atividades específicas. “Por enquanto, a tecnologia é um recurso. Mas acreditamos na ferramenta em desenvolvimento da Microsoft para torna a experiência realidade.”

O professor explica que o metaverso é uma evolução das redes sociais. E o mundo de realidade expandida pode ser ancorado no conceito de definição. É como se fosse um planeta, onde diferentes empresas começam a ocupar. “Ele precisa ter outros elementos de interação, a possibilidade de mexer em alguma coisa, de operacionalizar.”

Diversas instituições estão promovendo cursos e palestras para se aprofundar no assunto. No fim deste mês, Alex Moga, fundador e CEO da Metaverse University, participa do maior fórum de ensino superior da América Latina, a 24ª Edição da Fnesp.

No último mês, a UNISUAM lançou o Pólen Cast, um podcast voltado para o Empreendedorismo e Inovação, promovido pelo seu Polo de Inovação – Pólen. O episódio foi lançado ao vivo no espaço virtual, com transmissão simultânea no YouTube, e trouxe o tema “Metaverso, Blockchain e Criptos: Como aproveitar essa oportunidade?”. 

UNISUAM transmitido podcast no metaverso, em que professores e palestrantes abordaram os aspectos da tecnologia, melhorias e suas aplicações no dia a dia (Foto: UNISUAM / Divulgação

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