Qual será o futuro da educação?

Especialistas fazem reflexões de como serão as salas de aula, o papel do professor, as avaliações, entre outros contextos que envolvem o ensino

por: Eduardo Wolff | eduardo@padrinhoconteudo.com
imagem: Freepik

Um questionamento que muito provavelmente passa pelas cabeças de vários gestores escolares, coordenadores pedagógicos, professores e até alunos é: qual será o futuro da educação?

Para desvendar de alguma maneira o que está por vir, o Google for Education desenvolveu um estudo chamado O futuro da educação. O levantamento foi feito em parceria com a empresa Canvas8, realizado em 24 países, que apontou algumas tendências na área educacional.

Segundo o relatório, “as questões que moldam o futuro são cada vez mais globais e complexas e irão exigir habilidades multidisciplinares para chegarmos a soluções ponderadas. A educação continua sendo a instituição mais poderosa que a sociedade tem para desenvolver a mentalidade e as habilidades necessárias à colaboração em busca de um futuro coletivo melhor” .

Outra pesquisa, Reimaginar nossos futuros juntos: um novo contrato social para a educação, desenvolvida pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), também aponta o que pode acontecer. O estudo sinaliza que: “as salas de aula e as escolas são essenciais, mas, no futuro, elas precisarão ser construídas e vivenciadas de forma diferente.” 

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O documento ainda fala que “a educação deve desenvolver as habilidades necessárias nos locais de trabalho do século 21, levando em consideração a natureza mutável do trabalho e as diferentes formas pelas quais a segurança econômica pode ser suprida. Além disso, o financiamento educacional mundial deve ser ampliado para garantir que o direito universal à educação seja protegido.”

Em alusão ao Dia Internacional da Educação, criado em 28 de abril de 2000 para promover o debate sobre assuntos relacionados ao segmento, o Educação em Pauta questionou alguns especialistas sobre as projeções para o sistema educacional. 

Evolução da sala de aula

Dependendo do que se entende por clássico e tradicional, independente da tecnologia que se tem, do crescimento da inteligência artificial e de todas as ferramentas disponíveis, o espaço do diálogo – no caso a sala de aula – será sempre relevante. É o que sustenta o professor e coordenador do Instituto para Inovação em Educação da Unisinos, Gustavo Borba.

O ambiente de sala de aula, pelo menos em alguma medida, necessita ser presencial. “Precisamos de um espaço onde a gente construa pertencimento, conexão, engajamento entre professores e alunos”, diz.

Borba acredita que dificilmente será com as cadeiras enfileiradas, onde um professor fala e os alunos escutam. “Especialmente, as instituições de Ensino Fundamental, que já têm um avanço nesse sentido, mas especialmente nos ensinos Médio e Superior estão começando a construir um caminho diferente. Para mim, o modelo clássico de um professor na frente e 30 alunos ouvindo é o modelo que está fadado a desaparecer”, constata.

Com visão semelhante, a pesquisadora e professora da Escola Politécnica da PUCRS, Lucia Giraffa, acredita que as aulas meramente expositivas, sem trazer problematização ou vinculação com interesses e contextos dos estudantes, não terão muito futuro. Isso independente se forem ofertadas presencialmente ou não.

Para ela, a aula enquanto troca e construção é mais do que tendência, é algo indispensável. “A informação está disseminada de maneira onipresente, sendo disponível para quem quiser acessar. No entanto, será mandatório diferenciar informação de qualidade, correta e útil para resolver os problemas da nossa vida”, complementa. 

Papel do professor 

Quando estudava na década de 1970 e 1980, Borba recorda que o papel do professor tinha como essência entregar o conteúdo para os alunos. Já nos dias atuais, além de um comunicador, o educador tem a função de fazer a mediação em sala de aula. 

Diante deste contexto, o especialista da Unisinos aponta que o papel do professor irá se amplificar, na medida que a informação está mais disponível e mais na mão das pessoas. “O uso indiscriminado de informação sem curadoria não necessariamente vai gerar um conhecimento. O docente amplia o seu papel de apoio ao estudante no seu processo de aprendizagem”, reforça.

Lucia pontua que, cada vez mais, o educador será um curador da informação. Cabendo-lhe fazer a seleção intencional de conteúdos e estratégias metodológicas para criar uma experiência de aprendizagem em que seus estudantes possam compreender os conteúdos e construir um conhecimento baseado em uma atitude crítico-reflexiva que faça sentido aos mesmos. “Compreender os porquês daquelas informações sistematizadas e poder, em curto ou maior prazo, aplicá-las para resolver problemas do seu cotidiano pessoal e/ou profissional”, diz.

Mudanças nas formas de avaliação

Quanto à forma de avaliar, Borba acredita que não será algo tão fácil de resolver no futuro. Provavelmente, os alunos serão avaliados com relação a outras habilidades. “Um aluno poderá demonstrar mais a sua criatividade, uma competência que é bastante fundamental”, exemplifica. 

Ele também acredita que a avaliação vai passar pela lógica de construir perguntas da melhor maneira para poder obter boas respostas, ou seja, o processo de avaliação será mais processual e efetivo. “As questões padronizadas entregam um pedaço do que é o processo de aprendizagem. Na realidade, entregam só a ponta final”, afirma.

No ponto de vista de Lucia, o sistema de avaliação precisa ser compatível com a abordagem didático-metodológica que o professor utiliza. A avaliação não é algo que se pense dissociado ao planejamento da disciplina. “Deve ser pensada de forma transversal, como elemento importante de acompanhamento dos processos de ensinar e aprender”, conclui.

O investigador de futuros e co-fundador da Aerolito, Tiago Mattos, destaca que é praticamente inevitável que não se tenha mudanças na forma de avaliação. “Imagina alguém que tem os recursos, como um ChatGPT, para fazer as perguntas que estão sendo demandadas pela escola? Como é que isso não vai implicar um novo tipo de avaliação? Seja para escrever uma redação, seja uma prova dissertativa, seja uma prova de múltipla escolha. A forma como a gente entendia, certo e errado, vai ter que mudar”, sustenta.

Enfim, o que esperar do futuro? 

Mattos destaca que em sua empresa, a Aerolito, existem estudos sobre o que pode vir pela frente, sendo um deles relacionado à transformação digital. A pesquisa aponta as chamadas “quatro forças dominantes” no digital: o que pode ser digitalizado, será; como também automatizado, personalizado e descentralizado.

Quando houver um impacto relevante nestas quatro forças dominantes, a escola terá um outro formato. “Não é o EAD, que é uma simples digitalização do formato tradicional. Muita gente confunde isso que estou falando com a escola perder a sensibilidade, o olho no olho, a construção do cidadão que se faz no ambiente analógico. Posso estar fora da internet com influência das forças dominantes ou posso estar na internet sem a presença das forças dominantes? Ser uma escola mais digital ou menos digital não significa estar virtualizada necessariamente”, ressalta.

Já Borba acredita que as mudanças estão muito relacionadas à formação de professores, espaços físicos e virtuais de sala de aula, currículo e ao uso de tecnologia. 

Muitas evoluções vão ser provocadas a partir de novas tecnologias, mas essa essência da construção coletiva do conhecimento permanecerá. Para ele, é difícil dizer qual é a ferramenta que vai aparecer, porque houve várias que, inclusive, surgiram e desapareceram, como o metaverso, e outras que vieram e ficaram, como o ChatGPT. “Essas tendências, acho que se concretizam, mas existe uma lógica, uma construção de mudança, que é a reconexão do ser humano”, sustenta.

A experiência da pandemia de Covid-19 deixou legados, de acordo com a professora e pesquisadora da PUCRS. Segundo ela, é preciso uma educação que “dê conta” deste cenário de mudanças intensas, aceleradas e de muitas incertezas quanto ao que de fato será o mercado para o trabalho e as profissões. “Uma educação que considere não apenas conteúdos ou aspectos técnicos, mas sim uma visão mais abrangente, humanista e integrada de pertencimento a um planeta que precisa de cuidados, de uma sociedade que é plural e diversificada”, projeta.

Como as escolas podem se preparar?

Lucia acredita que é necessário uma infraestrutura lógica e física bem flexível. Este ambiente precisa permitir aos professores criarem experiências de aprendizagem diversificadas por além daquela formação física a que a gente está acostumado. “Os espaços das escolas têm que se tornar potencialmente aptos a atividades colaborativas e diversificadas com salas configuráveis”, amplia.

Outro aspecto apontado é o incentivo a um projeto pedagógico da escola para atender essas demandas e com formações em serviço e incentivo a revisar currículos. “O currículo na educação básica é muito regulado pelo Ministério da Educação, mas temos que pensar em uma grande revisão curricular para ver a adequação de conteúdos”, ressalta.

Ela aponta que se faz necessário uma revisão do material didático, quer seja em plataforma ou não. “A solução para ser eficaz e eficiente deve ser construída pelo ecossistema escolar em que gestores, família, docentes, estudantes e colaboradores compreendam o que precisa ser feito e se engajem em uma mudança disruptiva que afeta vários aspectos”, aponta.

Já Mattos indica pontos de atenção para as lideranças das escolas. É importante que participem, de forma efetiva, de eventos de inovação genuínos. Com isso, aplicar esse pensamento crítico adquirido, inclusive questionando essas mesmas fontes de inovação. “É assim que as lideranças vão poder absorver conceitos que desconstroem a escola e que reconstroem uma nova”, recomenda.

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