O que pode mudar na avaliação da formação de professores?

Anunciadas pelo Inep, as alterações estão previstas para o ciclo de 2024. Especialistas e instituições de Ensino Superior opinam sobre essa iniciativa do MEC

por: Eduardo Wolff | eduardo@padrinhoconteudo.com
imagem: AdobeStock

Recentemente, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) divulgou os resultados dos Indicadores de Qualidade da Educação Superior. Entre os estudos para melhorias dos cursos de licenciaturas foram apontados aperfeiçoamentos dos instrumentos de avaliação in loco e identificação de propostas para avaliação mais detalhada dos estágios supervisionados dos docentes.

Atualmente, a avaliação das licenciaturas é realizada pelo Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), de três em três anos, igual a todos os outros cursos de Ensino Superior brasileiro. 

Com essas alterações, a forma de avaliação da formação de professores nas universidades brasileiras deve mudar em 2024, com a inclusão de um Enade Licenciaturas. A ideia é introduzir novos instrumentos, produzir mais informações e avançar em objeto de observação. 

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Para a pedagoga e diretora da Escola Brasileira de Professores (Ebrap), Guiomar Namo de Mello, a iniciativa é uma oportunidade elogiável, com a possibilidade de elevar o patamar da educação. No entanto, ela alerta que é necessário ter mais clareza do que será exigido dos professores.

Guiomar recorda que, em 2019, o Conselho Nacional de Educação (CNE) definiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e instituiu a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação). “Neste documento constam as propostas de licenciatura, com competências e habilidades para ter um referencial. Agora, cabe a cada instituição de Ensino Superior ter sua autonomia de projeto pedagógico e ao MEC fiscalizar”, argumenta.

Para ela, as instituições de Ensino Superior terão que se adaptar, pensar como vão organizar seus cursos. “Por meio da avaliação que o MEC induz a formação dos professores. A outra maneira é por meio de recredenciamentos de cursos”, complementa.

Conforme comenta o diretor executivo do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), Ernesto Martins Faria, a medida é positiva, pois há uma grande necessidade de melhoria nas avaliações do Ensino Superior, e isso de forma geral, não só para as licenciaturas. “O Enade, como um todo, precisa ser repensado e não gerar apenas medidas comparativas sem muitas vezes conversar com as demandas do mercado de trabalho”, sinaliza.

A pedagoga e diretora de planejamento da Vitru Educação, Thuinie Daros, acredita que a proposta do Inep é uma alternativa baseada na crença de que esta medida poderia estimular as instituições de ensino a investirem mais energia em programas de estágio e práticas docentes. “Pode incentivar uma formação mais voltada para a realidade educacional, impulsionando a qualidade de oferta de ensino nas universidades brasileiras”, disse.

“É fundamental para garantir que os licenciados estejam preparados para enfrentar os desafios reais da sala de aula, mas esta mudança precisa estar acompanhada por ações de fomento de qualidade na formação oferecida pelas próprias instituições de Ensino Superior”

Thuinie Daros, pedagoga e diretora de planejamento da Vitru Educação

Thuinie ainda salienta que poderá auxiliar a colocar uma lupa nas questões práticas e de estágio, e embora nos ajude a enxergar melhor os possíveis gargalos, não necessariamente “atacará” a raiz do problema. “É fundamental para garantir que os licenciados estejam preparados para enfrentar os desafios reais da sala de aula, mas esta mudança precisa estar acompanhada por ações de fomento de qualidade na formação oferecida pelas próprias instituições de Ensino Superior”, pontua.

Para isso, ela acredita que se deve iniciar com uma profunda análise profissiográfica e o mapeamento de competências que estão sendo desenvolvidas. O aspecto metodológico é um outro ponto que destaca de extrema importância. “Acredito que os modelos formativos aos professores necessitam ser conduzidos por professores inovadores, entusiasmados, inspirados, criteriosos e altamente qualificados em relação aos processos de aprendizagem. Afinal, só desenvolvemos no outro aquilo que temos desenvolvido em nós mesmos”, conclui.

E o que pensam as instituições de ensino?

Segundo o diretor da Faculdade Instituto Ivoti, Jorge Augusto Feldens, é relevante essa maior ênfase aos estágios supervisionados e à prática docente, aspectos fundamentais para uma formação sólida e efetiva. “Essa iniciativa é extremamente louvável, pois reconhece a importância da experiência prática e da interação com alunos e professores reais no processo de formação dos futuros educadores”, frisa.

Ainda, conforme Feldens, essa ação vai ajudar a garantir que os cursos de licenciatura sejam capazes de preparar os estudantes de forma eficaz, capacitando-os para lidar com a diversidade de situações e demandas que enfrentarão em suas carreiras. “Ao valorizar a presencialidade na formação, o Inep reconhece que o contato face a face e humanizado com o ambiente educacional é fundamental para o desenvolvimento de habilidades pedagógicas e para a compreensão das nuances da prática docente”, ressalva.

Já o diretor-geral das Faculdades Integradas de Taquara (Faccat), Delmar Henrique Backes, destaca que a maior preocupação é a retomada de uma educação de qualidade e comprometida com os acadêmicos. Ele reitera que não se preocupa com as mudanças, mas que é preciso focar na retomada de uma educação superior séria. “Principalmente no que se relaciona com a preparação de professores competentes, que tenham tido vivência com colegas, professores em sala de aula, na modalidade presencial”, enfatiza. 

Na visão da coordenadora pedagógica institucional da Sociedade Educacional Três de Maio (Setrem), Elisabete Andrade, o que está em questão na proposta de criar um Enade Licenciaturas é o processo de qualificação dos cursos de formação de professores. Para ela, a mudança no modelo de avaliação parece estar vinculada à necessidade de impulsionar uma formação que esteja pautada em uma relação direta com a prática que será desenvolvida no contexto das escolas. 

Segundo Elisabete, há muito tempo, esta tem sido uma questão fundamental, pois os cursos de formação de professores têm se mostrado frágeis, entregando profissionais com pouco repertório contextualizado com a realidade das escolas. “Também entendo como uma necessidade as avaliações e o desenvolvimento de uma cultura de feedback, com o intuito de fortalecer a qualidade da formação de professores no Brasil”, complementa.

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