BNCC da Computação e o desafio das escolas
Especialista traz reflexões sobre como trazer os conhecimentos sobre os mundos digital e computacional para o ambiente escolar
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Inteligência Artificial foi o tema que embalou 2023! Há exato um ano, em novembro de 2022, a empresa OpenIA disponibilizava ao mercado o - hoje já famoso - ChatGPT, popularizando usos e debates acerca das potencialidades e dos limites da IA em nossas vidas!
O lançamento da OpenIA (e aplicações correlatas que surgiram na sequência) foi responsável por tangibilizar o potencial revolucionário da inteligência artificial sobre a vida produtiva tal qual a conhecíamos. Isso porque inteligência artificial, no mundo das invenções, é tecnologia que remonta minimamente aos anos 1970 e, ao longo dos últimos 50 anos, foi sendo desenvolvida, melhorada e aplicada. Mas nós, eminentes cidadãos do mundo físico, vimos vivendo as últimas 5 décadas sem nos dar conta do crescimento da IA, sem nos preocupar com ela, senão em digressões oníricas e ficcionais cinematográficas, literárias ou futuristas. Eis que o lançamento da OpenIA traz a inteligência artificial para as nossas vidas, rotinas e contextos. E o cenário que se nos apresentou foi de não estarmos preparados para tamanha revolução da prática, do pensamento e das possibilidades de produção do conhecimento.
É um fato que a popularização da IA causou excitação! Segundo dados da própria Open IA, estima-se que o ChatGPT atingiu 100 milhões de usuários ativos ainda em janeiro de 2023. Apenas para colocar o dado em perspectiva, o TikTok levou 9 meses para alcançar os mesmos 100 milhões de usuários, enquanto o Instagram levou 2,5 anos e a Netflix precisou trabalhar 3,5 anos para alcançar seu 1º milhão de assinantes, segundo a Reuters.
Nas escolas, o impacto não foi diferente... os usos do ChatGPT foi tema de inúmeras palestras e jornadas pedagógicas de abertura do ano letivo, quando docentes foram, simultaneamente, estimulados a se apropriarem da ferramenta e desafiados a encontrar estratégias de regulação de usos. Em poucas semanas, professores começaram a compartilhar práticas e metodologias baseadas na ferramenta, numa tentativa e erro de incorporar tecnologia e modernidade aos fazeres pedagógicos e o Chat GPT virou herói e algoz nas escolas. Os dilemas relacionados à autoria, plágio, avaliação, saber docente e erros da IA, por exemplo, dentre tantos outros, surgiram e seguem sem resposta, posto que ainda precisaremos de tempo para equacionar com segurança os desafios da contemporaneidade.
Mas, sozinho, o tempo não cuidará de responder às perguntas... As respostas virão da experiência e é preciso olhar os usos da tecnologia aplicados à Educação como uma dimensão da nova professoralidade. Inteligência Artificial não é um hype que será substituído por outra tendência qualquer. A tecnologia não arrefecerá, tampouco deixará de impactar e transformar nossas práticas. Cumpre-nos, portanto, incorporá-la às Escolas, revisitando práticas e metodologias e, fundamentalmente, sendo responsavelmente transformados em nossos saberes e fazeres.
Para tanto, faz-se imperativo o entendimento da tecnologia, bem como de conhecimentos sobre os mundos digital e computacional como partes estruturantes dos currículos e, nesse sentido, a BNCC da Computação nos oferece um conjunto de premissas e competências a serem desenvolvidas pelos estudantes. E também pelos professores!
O documento complementar à BNCC surge da necessidade de definição de escopo da competência geral Cultural Digital, que a Base Nacional Comum Curricular descreve como competência de compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de forma crítica, significativa e ética, para que o estudante seja capaz de comunicar-se, acessar e produzir informações e conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria. Nessa perspectiva, a BNCC da Computação estabelece os eixos curriculares Pensamento Computacional, Mundo Digital e Cultura Digital, cada qual com um conjunto referente de objetivos de aprendizagens, competências e habilidades.
A fim de contribuir para o direcionamento dos currículos, o documento ainda oferece conjunto temático para cada um dos eixos. No eixo Pensamento Computacional, abstração, decomposição, análise, automação, reconhecimento de padrões e algoritmos aparecem como conhecimentos a serem fomentados. Já o eixo Cultura Digital visa promover conhecimentos e práticas relacionadas ao letramento, cultura e segurança digitais, bem como às relações entre tecnologia e sociedade. Por fim, o eixo Mundo Digital dedica-se à representação de dados, codificação, hardwares e softwares, comunicação e redes, distribuição e processamento de dados e informações.
Frente a essa mandala de competências e habilidades, é importante reiterar que a formação digital na Educação Básica, como uma das competências gerais da Base Nacional, constitui-se de maneira interdisciplinar por premissa; assim, é compromisso curricular comum a todos os docentes, de todos os componentes curriculares, em todos os anos escolares. Mas as equipes docentes estão prontas para esse desafio? Qual o nível de maturidade digital das escolas e dos docentes? Quanto de estudo e experimentação em tecnologias educacionais está sendo feito nas escolas? Como os professores estão sendo letrados digitalmente e formados para desenvolver as competências computacionais dos estudantes?
Sabemos que a escola precisa ser o espaço de experimentação do mundo. Competências devem ser desenvolvidas e aplicadas pelos estudantes ainda na escola e é nessa perspectiva que a BNCC da Computação vem-nos oferecer algumas chaves que contribuem para que os estudantes abram as portas do presente. É imperativo, no mundo de hoje, formá-los competentes na relação com a tecnologia em suas múltiplas dimensões: ética, cidadã, de consumo, de salvaguarda, autoral e produtora de conteúdo, instrumental, técnica e comunicacional.
Nesse mundo pautado pela evolução tecnológica, a escola não deveria estar à margem da inovação. Deveria ter protagonismo! A atualização das práticas docentes não pode estar centrada em iniciativas individuais de entusiastas da computação... A formação digital dos estudantes é imperativa na contemporaneidade e as disposições curriculares já foram traçadas. Já é tempo de estudo, de experimentação, de erro, de ousadia, de autoria. Já é tempo de atualização de práticas, de métodos, de estratégias. Já é tempo de investimento em recursos e em formação. Já é tempo de solução! Você já começou?
* Gerente Executiva do SAS Plataforma de Educação