Tecnologia: como engajar os alunos nas atividades domiciliares?
Uso de ferramentas tecnológicas ajuda no emprego de metodologias ativas e no engajamento dos alunos

As atividades domiciliares adotadas pelas instituições de ensino para dar continuidade ao ano letivo, após a suspensão das aulas presenciais, ainda geram muitas dúvidas, principalmente ao que se refere ao uso da tecnologia. A coordenadora pedagógica da Rede La Salle, Elisa Medeiros e o Mestre em Tecnologias Emergentes em Educação, José Motta, trazem algumas dicas para as escolas sobre como usar esses recursos e garantir o engajamento dos estudantes. Confira:
SINEPE/RS: Quais são os cuidados que devem ser tomados nessa nova maneira de dar aula? E quais os maiores desafios?
Motta: O maior ponto de atenção nesse momento, diante do isolamento provocado pela pandemia, é entender que não é possível entregar "via web" todos os elementos (atividades, explicações, exercícios e interações) que eram feitos no formato presencial. E ainda, não há como transformar, num piscar de olhos, o ensino presencial em modalidade EaD, a tão falada Educação a Distância, que possui um formato completamente diferente, complexo e com um design bem específico. O que as escolas estão procurando hoje é um caminho para a realização de um Ensino Remoto Emergencial. Ou seja, uma trilha que contemple basicamente três aspectos:
a) uma boa comunicação entre escola-família e aluno-professor: de forma clara e objetiva, evitando um ritmo de envio diário das tarefas, orientações. Faz-se necessário organizar uma agenda semanal. Encaminhar "pacotes de atividades" ao longo da semana, pode ser uma boa opção para que a escola não imprima um ritmo frenético de disparos, dando assim o tempo necessário para que os pais e os alunos possam se organizar e se adaptar ao novo modelo.
b) um conteúdo diferenciado: Tanto os gestores da escola, quanto os professores, precisam entender que estamos vivendo um momento diferente. Portanto, a entrega precisa ser diferente. O pior caminho será tentar reproduzir o que era feito em sala de aula. Assim é importante alternar a gravação de videoaulas com demais atividades, além de aulas síncronas.
c) um registro eficaz: apesar de não ser mais necessário cumprir os 200 dias letivos, as 800 horas ainda são exigidas.Mas o que fazer então? A instituição precisa "formar" os professores e equipe pedagógica para que dominem o uso de ferramentas para esse fim. É possível que a própria atividade que será realizada pelos alunos, gere esse banco de dados, que servirá tanto como indicador de presença do aluno na atividade, quanto de prova física de execução da mesma. Também é possível fazer com que algumas dessas propostas sirvam como instrumento de avaliação.
Elisa: Na minha opinião são muitos os cuidados que precisamos ter:
a) Planejamento eficiente: O professor precisa prever a sua prática e ter presente o que pretende desenvolver com aquela atividade proposta (ter intencionalidade) e o mais importante é estar aberto a revê-lo diariamente, percebendo o que foi positivo e o que precisa ser melhorado, esse processo chamamos de prática reflexiva.
b) Garantir momentos síncronos e momentos assíncronos: os momentos on-line garantem a interação professor e aluno com a aprendizagem, é o momento em que os alunos podem tirar dúvidas, e o professor pode fazer a explicação do conteúdo que quer introduzir, entre outras tantas possibilidades nestes momentos.
c) Cuidado em relação à equidade;
d) Manter a qualidade deste ensino;
e) Garantir a aprendizagem.
Para Elisa, os principais desafios nesta nova modalidade é engajar os alunos para que participem e realizem as atividades, preparar os professores e garantir uma aprendizagem de qualidade,o qual necessita de uma parceria escola-família.
SINEPE/RS: Como escolher as melhores ferramentas?
Motta: A escolha das ferramentas, para que possamos criar a trilha sugerida acima e para que ela tenha um ritmo adequado, dependerá muito daquilo que a escola já possui de infraestrutura, domínio de novas tecnologias e fluência dos professores nesse mundo digital. Sugiro, de forma geral, as seguintes:
Comunicação: WhatsApp ou SMS e E-mail. Se a escola já possui um aplicativo/plataforma de mensagens entre escola e família/aluno, continua com o que já funciona.
Formato do conteúdo: breves vídeos autorais, podcasts autorais, vídeos já existentes no Youtube (isso requer curadoria), artigos ou recortes de revistas (nada extenso), charges, histórias em quadrinhos, indicações das páginas do livro ou apostila (o conteúdo também está ali) e outros materiais que sejam interessantes. Nada de mais do mesmo. Os alunos são diferentes e, cada um, aprende de um jeito e no seu ritmo. Se o professor variar os formatos do conteúdo, atingirá positivamente mais alunos da sua turma. No início tudo isso dá trabalho, mas o resultado é incrível e o aprendizado também. Estamos vivendo tempos de reinvenção e de ressignificação de vários produtos e serviços do mundo. A educação não pode ficar de fora.
Registro: as ferramentas que promovem interação e fornecem o devido registro são várias. Mas, indico aqui aquelas que são fáceis de parametrizar e usar: Google Forms, Socrative e Kahoot.
Ferramentas adicionais: Padlet ou Google Classroom (sala de aula virtual), Mentimeter ou PollEverywhere (Interação e coleta de dados), ScreenCastify (gravação de tela).
Elisa: As melhores ferramentas são aquelas que conseguem se aproximar mais dos professores e alunos proporcionando melhor acesso por ambos. Filmes, vídeos, , redes sociais(restritas ao grupo), livros digitais, classroom, hangout, Meet, PodCast, são algumas opções. Lembrando que os vídeos que os professores gravam e postam para os alunos são excelentes formas de explicar os conteúdos, mas estes não garantem os momentos sincrônicos, pois não há uma interação professor e aluno e objeto de conhecimento.
SINEPE/RS: Como engajar os alunos? E manter esse engajamento?
Motta: O Professor do Século XXI precisar ser um "Designer de Experiências Emocionantes de Aprendizagem". A neurociência aplicada à educação possui inúmeras evidências científicas de que, quando um professor emociona o aluno, ele libera boas doses de dopamina que, em seu cérebro, funcionará como uma espécie de "botão salvar". Ou seja, no ensino presencial em tempos normais, ou no ensino remoto dos novos tempos, não cabem aulas mortas. Sugiro que cada professor ligue a chave do Modo Empatia em seu nível máximo e, ao se colocarem no lugar dos seus alunos, pensem o que gostariam de receber nesse momento: uma enxurrada de conteúdos inúteis ou a essência daquilo que é importante de cada aula. Se cada professor entregar, em diversos formatos, o "refrão" da aula, a mágica acontecerá!
Elisa: O engajamento acontece quando a aula tem sentido para o aluno, para isso é necessário que as aulas sejam interativas, criativas, dinâmicas, em que os alunos precisam participar e não apenas escutar o professor explicar os conteúdos.
SINEPE/RS: Como essas tecnologias podem ajudar no emprego de metodologias ativas durante as atividades domiciliares?
Motta: As Metodologias Ativas de Ensino são estratégias bastante inovadoras e ousadas em termos de reposicionamento do aluno, professor e conteúdo para se chegar a um objetivo: a aprendizagem. E que fique muito claro: metodologia ativa de ensino não é sinônimo de tecnologia educacional. Tecnologia é ferramenta. É um meio que pode ser usado para potencializar e otimizar uma metodologia. Jamais será o fim. Há muitos ecossistemas de ensino que fazem um verdadeiro show pirotécnico em suas redes sociais e web sites, mostrando o uso de aplicativos ou plataformas digitais com a bandeira: aqui usamos metodologias ativas de ensino! Precisamos ter muito cuidado com isso. Bem mais importante que a ferramenta usada é a metodologia que fundamenta e justifica o uso.
Mas como podemos, então, utilizar alguma Metodologia Ativa de Ensino de forma remota? Sugiro aos professores que pesquisem e procurem incorporar em suas aulas as seguintes metodologias nesse momento: FlippedClassroom (Sala de Aula Invertida), PeerInstruction (Instrução por Pares), Think-Pair-Share (Pensar, Unir e Compartilhar), Gamification (Gamificação) e Storytelling for Education (Contação de Histórias com fins Educacionais). O uso do JigsawClassroom, Team Based Learning, Project Based Learning, Design Thinking, Rotação por Estações, entre outras, seriam demasiadamente trabalhosas ou não adequadas para o momento presente, que requer um pouco mais de fluxo e processos mais enxutos.
Elisa: As tecnologias facilitam a utilização de uma metodologia ativa,podendo a escola utilizar, por exemplo, o ensino híbrido, a aula invertida, a metodologia de projeto com situação-problema, em que o aluno precisa colocar a “mão na massa" , entre outros. Através de um ensino baseado em metodologias ativas o aluno éprotagonista de seu conhecimento, busca, pesquisa, interage, participa, e não é um agente passivo no processo de aprendizagem.
SINEPE/RS: Qual a importância dos canais de comunicação (ferramentas para que as escolas se comuniquem com as famílias/estudantes) nesse momento?. E como utilizá-las da melhor maneira possível?
Elisa: Os canais de comunicação são fundamentais nesse processo, se tornando a forma mais satisfatória para a escola se comunicar com as famílias e alunos. Os sites, redes sociais (facebook, Instagram e Whatsapp), e e-mails são algumas das alternativas que podem auxiliar para uma comunicação eficaz.
SINEPE/RS: Qual a importância dos professores buscarem padronizar as ferramentas utilizadas?
Motta: A padronização das ferramentas de comunicação e de registro das atividades se faz necessário. Mas, o formato de entrega dos conteúdos e as ferramentas de interação entre o aluno, o professor e os conteúdos, precisa ser o mais diversificado possível. Os alunos precisam ser surpreendidos, semanalmente, por esses elementos que fazem parte do pacote de atividades recebidas. Se todos os professores usarem sempre: mesma ferramenta e mesmo formato, o engajamento terá curva descendente. Sugiro que os professores se ajudem no que se refere a compartilharem as práticas que estão dando certo, os diversos caminhos que estão encontrando para entregar conteúdos relevantes e significativos aos alunos, mesmo não estando juntos fisicamente.
A escola fechou as portas, mas a aprendizagem não pode parar. A escola inspiradora é feita por pessoas que inspiram. E estas, não estão com os seus cérebros fechados. Arrisco dizer que estão com as suas mentes mais efervescentes do que nunca! Pois, o professor que realmente ama o que faz, se alegra ao entregar o melhor de si para que o outro melhore, para que o outro evolua, independente do ambiente utilizado. Esse breve momento de isolamento social está servindo, também, para que escolas e professores reflitam sobre o seu verdadeiro papel em uma sociedade em constante transformação, que aprendam sobre o mundo que existe fora dos muros da escola, para o qual os alunos estão sendo preparados.
Elisa: A padronização de ferramentas utilizadas pelos professores facilita a organização dos alunos, principalmente dos anos finais e ensino médio, que têm em média doze componentes curriculares. Imaginem a situação do aluno com doze professores diferentes e cada um, com um tipo de metodologia e ferramentas tecnológicas, com certeza, esses teriam uma dificuldade maior em se organizar e acompanhar o processo.